Já poucos se lembrarão, de alguns dos emblemáticos locais de convívio e socialização que mesmo em tempo de ditadura, proporcionavam o encontro das gentes na cidade da Guarda.
Foi assim com o café Mondego e os valiosos painéis de azulejos que dignificavam o espaço e o tornaram um verdadeiro ponto de encontro e convívio entre os guardenses e forasteiros.
As mesas e os espaços bem definidos, de um lado a direita política, de outro a esquerda, fosse ela radical ou moderada que, apesar das divergências sabiam conviver salutarmente.
E, pelas 17 horas, impreterivelmente, o empregado de mesa colocava as toalhas de azul turquesa, em certas mesas, para que as senhoras pudessem tomar o chá quente que acompanhava as torradas e a conversa das coscuvilhices da terra.
Destino do «Mondego» o mesmo de sempre - destruição completa e venda para uma agência bancária!
Depois foi o Monteneve, outro café emblemático da cidade onde, ainda na ditadura se cruzavam a direita conservadora do poder e a gente do «reviralho». Onde, sem excepção não havia «direito de admissão». E, de onde se contam episódios pitorescos uns, outros nem tanto, da caça às bruxas.
Destino do «Monteneve», o mesmo - fecho e venda para uma loja de ilusões vestidas, ou despidas.
E, já bem mais antigo, mas não menos simbólico, a Cristal, situado na rua do comércio.
Ainda me lembro de, em pequeno, ir à Cristal, pela mão do meu pai e, ter o prazer de me sentar à mesa e um senhor, já de certa idade, me engraxar os sapatos.
Hoje tudo desaparece.
Agora, fecha mais um café, o Central.
Há mais de 20 anos, ainda proporcionava o encontro de muitos de nós. Destino, o mesmo de sempre: agência bancária.
O «Central» era um local de excelência, por natureza, e onde há pouco tempo se evocou a memória do Zeca numa tertúlia inesquecível, com o espaço totalmente esgotado.
Todas as vilas e cidades do interior têm um café Central.
Ou melhor, agora, aqui na Guarda já não há central!!
Desaparecem os sítios ficam ao menos as memórias.
Hoje, abrem quiosques a que chamam cafés, exíguos, com poucas ou nenhumas cadeiras e mesas, para não possibilitar que as pessoas convivam e, onde o freguês toma o café de pé e, compra o pão, de duvidosa qualidade, que sai em fornadas sucessivas, para embrulhar e levar sem conversa.
Hoje, já não existe o prazer da conversa, da amena cavaqueira onde se conjuravam tantos e tantos movimentos de contestação e revolta, onde se marcavam encontros mas também desencontros. Mas, onde havia aquele sempre português prazer, tão genuíno e ancestral de beber a bica, «cimbalino» ou café entre dois dedos de conversa e, umas «passas» de um SG fosse ele gigante ou ventil, activo ou passivo fumador, que importava, se o prazer era o de estar e, conviver no café.
«stop
a vida parou
ou foi o automóvel?»
Carlos Drumond de Andrade.