Vem
isto a propósito de mais um reacendimento dos conflitos que cronicamente
dilaceram aquela casa, percetível nos últimos dias em jornais nacionais, redes
sociais e outras formas de difusão da mensagem. A história conta-se em poucas
palavras.
Os
tribunais condenaram a ULS a devolver a dois médicos a famosa multa de mais de
33 mil euros por causa do uso de papel timbrado da instituição na realização de
um abaixo-assinado por causa das maternidades. A questão arrastou-se durante
anos na justiça e o seu epílogo desabou agora em cima de uma administração tão
preocupada com o foguetório e o faz-de-conta que não consegue ver mais longe do
que o seu nariz.
Tanto
quanto se percebeu, a administração resolveu cumprir uma das sentenças,
devolvendo uma multa de mais de 15 mil euros ao anestesista Matos Godinho, mas
não a outra, manifestando a intenção de recorrer na justiça contra a devolução
da multa de 17 mil euros ao oftalmologista Henrique Fernandes. Isto apesar de
ambas as sentenças respeitarem à mesma matéria e de visarem factos iguais. A
consequência imediata foi a ameaça de demissão de Matos Godinho da direção do
serviço de anestesia, face à projetada e injustificada duplicidade de critérios
da administração.
É
do conhecimento público que Henrique Fernandes é há anos um dos mais incómodos opositores
à deslocação de valências hospitalares para a Covilhã, tendo ficado famoso o
processo disciplinar que há mais de 10 anos o acusou de gastar a eletricidade
do hospital por ter na altura colocado no serviço de oftalmologia diverso
equipamento para tratar doentes, impedindo assim o efetivo encerramento do
mesmo.
A
poucos causará espanto, sabendo-se como funcionam as coisas no nosso país e
conhecendo-se a pouca inteligência e a muita rusticidade da maioria dos nossos
políticos, que as suas ações cívicas tenham servido de catalisador a frustradas
e patéticas iniciativas repressivas. É caso para se dizer que há quem goste de
ir à lã e de sair de lá tosquiado…
Estas
injustiças, ironicamente, não só não alcançaram os fins pretendidos como
transformaram o médico numa figura incontornável nalguns dos dossiês mais escaldantes da instituição.
Que o digam Fernando Girão, o único presidente de uma ULS do país a ter sido algum
dia criminalmente condenado no exercício de funções, Ana Manso, a quem o médico
estilhaçou a carreira política em menos de um abrir e fechar de olhos, ou Vasco
Lino, o ex-condenado por crimes de abuso de confiança fiscal que o médico
escorraçou para a Covilhã no rescaldo das ilegalidades e decisões abusivas que
assolaram o serviço de cirurgia da instituição e que o colocaram praticamente
em coma.
Esta
guerra das multas teve origem numa decisão suicida do tempo de Fernando Girão.
Não era um conflito da atual administração e muito menos de Álvaro Amaro, o
verdadeiro presidente da ULS da Guarda. Um político suficientemente inteligente
e sereno teria resistido à tentação de retaliar contra as divertidas
provocações que o médico lhe dirigiu intencional e publicamente e ter-se-ia
afastado da decorrência normal desta guerra, limitando-se a ver respeitadas e
cumpridas as decisões judiciais.
Álvaro
Amaro e o seu homem de mão na ULS só têm agora duas opções: manter a intenção
de tratar Henrique Fernandes de forma diferente, perseguindo-o mas elevando-o
aos olhos da comunidade, ou recuar e cumprir com humildade a sentença judicial,
não sem deixarem de ter feito uma triste figura. De facto, não havia
necessidade.
Há
certos acontecimentos que humilham e que desabonam mais a sabedoria humana do que
quaisquer outros eventos deste mundo. Álvaro Amaro já deveria ter experiência
suficiente para o saber. Mas, pelo vistos, como diz o ditado, nunca é tarde
para aprender…
(Crónica jornal O Interior - 9 de Novembro 2016)