quinta-feira, março 23, 2017
quarta-feira, março 22, 2017
Ponto de Vista
Muito se falou e
escreveu nos últimos dias acerca da polémica que rodeou o dossier da substituição da administração da ULS da Guarda. A coisa
estalou com a vinda a público de um e-mail no qual alegadamente a distrital do
PS ameaçou retirar a confiança política ao ministro da Saúde por discordar da
proposta em discussão. E digo alegadamente, porque hoje já se sabe que essa
desconfiança se reportava apenas à administração em causa.
Vamos então aos factos
e que depois cada um julgue por si.
O nome de quem se
falava para presidir à administração era o de Isabel Coelho, atualmente
responsável pela gestão da unidade de saúde familiar da Ribeirinha. Isabel
Coelho terá tentado impor como diretora clínica a médica dermatologista Fátima
Cabral. Ora, foi aqui que começaram os problemas. E porquê? Fátima Cabral foi a
diretora clínica do consulado de Ana Manso, personagem há muito ligada ao PSD e
detentora do triste recorde de ter presidido à mais curta administração de
sempre do nosso hospital. De facto, a equipa de Ana Manso e de Fátima Cabral
foi demitida por incompetência ao fim de menos de um ano em funções, tendo
deixado como imagem de marca vários escândalos e muitos problemas na
instituição.
Fátima Cabral apôs no
passado a sua assinatura em diversas decisões, no mínimo, de muito duvidosa
sensatez. Por exemplo, subscreveu o pedido de vinda do marido de Ana Manso para
a Guarda e confirmou mais tarde a sua cedência pelo hospital de Castelo Branco.
Aprovou a sua inenarrável nomeação para o cargo de auditor interno, e, quando a
coisa deu para o torto, o seu discreto regresso a Castelo Branco!
Isto é, Fátima Cabral,
que até achava muito bem que fosse um marido a fiscalizar os atos gestionários
da esposa, esteve sempre disponível para tudo aquilo que Ana Manso achasse que
precisava.
Além disso, contribuiu
grandemente para prejudicar os interesses da própria instituição, ao não tomar
decisões incontornáveis ou ao não se demitir quando não lhe permitiram que as
tomasse. É do domínio público o caso da cirurgia, serviço que viu a sua
idoneidade formativa ser-lhe retirada pela Ordem dos Médicos, exatamente por
Fátima Cabral nunca ter conseguido resolver o problema da sua direção de
serviço, que permaneceu por essa razão numa incompreensível gestão corrente.
Para piorar as coisas,
e digo-o com todo o à vontade porque nem sequer fui eu quem politizou esta
questão, Fátima Cabral apoiou-se no médico João Correia como assessor da sua
direção clínica. Só por coincidência, João Correia foi à data uma das
principais figuras da lista dissidente do PS de Virgílio Bento à Câmara, tendo
por isso contribuído em muito para o que se seguiu e para a conquista da
autarquia por Álvaro Amaro e pelo PSD.
Até a mim, que defendo
acerrimamente a despartidarização deste tipo de cargos, me é impossível não
compreender o absurdo de se defender que Isabel Coelho deveria poder – vá-se lá
saber porquê – integrar um elemento com um currículo tão desastrado e
incendiário na sua equipa.
Pode o PS local não ter
agarrado nesta questão pelo ângulo mais correto, dando o flanco às acusações
que depois choveram de todos os lados. Mas aceito, para mais conhecendo os
riscos conflituais inerentes a uma eventual reedição do regresso de Fátima
Cabral a este tipo de funções, que a escolha de Isabel Coelho é reveladora da
falta de bom senso que já no passado caracterizou por vezes o desempenho
institucional da médica.
Para tornar tudo isto
num circo, veio o PSD local chorar lágrimas de crocodilo e atacar o PS com o
argumento que em linguagem popular se chama de “corrida ao tacho”. Só a total
ausência de pudor ou a inconsciência do ridículo podem explicar que um partido
que se serviu nos últimos anos da ULS como agência privada de emprego para o
presidente da câmara e seus amigos, venha agora atirar pedras sobre o telhado
do vizinho.
O problema é que não só
o circo não acabou, como continuamos sem administração nova. Nada a que a ULS
não nos tenha já habituado. De facto, na Guarda há coisas que nunca mudam.
Muito bom dia a todos.
(Crónica na Rádio F –
20 de Março 2017)
quinta-feira, março 16, 2017
Ponto de Vista
Passou um ano sobre a
vitória inequívoca e nada surpreendente de Marcelo Rebelo de Sousa nas eleições
para a presidência da República.
Para início de conversa, tenho de confessar aqui
que Marcelo não foi o meu candidato. Dito isto, pintemos o quadro de trás para a
frente.
Marcelo fez uma
campanha à americana, alicerçada na sua projeção mediática. Foi calculista e
pragmático quanto baste, o suficiente para nem sequer precisar de partidos para
zarpar e vencer. Pode dizer-se que Marcelo já tinha ganho as eleições muito
antes de estas se iniciarem sequer.
Fez um esforço
inteligente e bem-sucedido para fazer esquecer à maioria dos portugueses as
suas origens. Filho de um colaborador do regime salazarista e do próprio
Marcelo Caetano, de quem aliás era afilhado, Marcelo cresceu rodeado de pajens,
marqueses e marquesas, viscondes e viscondessas, enfim, de todo aquele séquito
que pastava na corte bolorenta e arcaica da época da ditadura. A hipocrisia,
então como agora, fazia escola. Marcelo nadou nessa onda como peixe na água.
Recordo-me desses
tempos, marcados pela caridadezinha, espelhada e retratada no Época e sempre com
o apoio do beato Movimento Nacional Feminino, o tal que vendia as
«prospridades» e os aerogramas àqueles que serviam de carne para as kalashnikov
na guerra de África.
Nessa altura ninguém
ouviu a Marcelo qualquer crítica dirigida aos que se deliciavam com o maná dos
palácios dos governadores pelas capitais do Império. Aliás, na biografia de
Marcelo, confessada ou ainda por confessar, não se vislumbra qualquer
referência ao serviço militar do atual chefe supremo das forças armadas.
Interessante! Recordo que falamos do tempo dos afilhados e, principalmente, dos
padrinhos! Padrinhos esses que alisavam o terreno e tiravam miraculosamente os
obstáculos da frente para que em tempo de mudança, fosse ela qual tivesse de
ser, tudo acontecesse pelo menos de forma natural e comedida. E sempre a
contento do que devia ser Marcelo nunca se voluntariou para essa patriótica
guerra, sabem?
O compasso do tempo e o
metrónomo marcam hoje a cadência das sucessões dinásticas e das oportunidades
sempre vistas na lógica da aspiração presidencial. Marcelo nega as evidências e
faz acreditar que o país está melhor. E quando as coisas contrariam o seu discurso
oficial, resolve os problemas com selfies. É o presidente das selfies e dos afectos.
Associa-se ao primeiro-ministro para vender
estabilidade. Mas é tudo fogo de vista! Marcelo é no fundo um catavento, como
aliás já alguém o apelidou. Esconde quanto pode os podres e não quer confusões…
Note-se que a dívida, a
partir de 2016, aumentou em mais de 14 mil milhões. Mas disso Marcelo não fala,
até porque pouco teria para nos dizer. Assim como não fala do facto de 1 em
cada 5 famílias não ter condições financeiras para fazer face às situações do
dia-a-dia. Tal como não fala, por conveniência, ou por receio, ou por qualquer
outra razão, do sentimento de revolta que cresce na sociedade. Não fala dos
hospitais que estão em situação de rutura financeira, nem confessa a realidade
cada vez mais difícil nas escolas, na justiça e em outros sectores ou serviços
fundamentais da sociedade, que muitas vezes só aparentemente funcionam.
Marcelo é inteligente
como poucos. Sabe gerir a tal coisa dos afectos como ninguém. Mas, tal como nos
casamentos, os afectos têm o seu tempo e o seu espaço. Chega sempre o momento
do confronto com as realidades que ninguém quer. E nessa altura é que se vai
ver.
Não precisamos de um
presidente que apareça todos os dias nas televisões, nos jornais, nas revistas,
enfim, em tudo o que seja mediático ou estrondoso. Talvez injustamente, essas
práticas trazem-nos à memória os presidentes omnipresentes das ditaduras, sejam
elas coloridas ou cinzentas.
Precisamos é de alguém
na presidência que chame a atenção, não só do povo, mas sobretudo dos
governantes, para os problemas, e que responsabilize sem equívocos e sem afectos
aqueles que têm a obrigação de os resolver ou, no mínimo, de não os causar. Hoje
que tanto se fala de populismos lá por fora, lembrar que cá dentro vamos tendo
um populacho que se diverte a ver o rei.
Tenham um muito bom
dia.
(Crónica Rádio F – 13 de
Março 2017)
sexta-feira, março 10, 2017
A gatunagem
Lesados do BES pagam 'saco azul'.
Parte dos milhões sacados aos clientes do papel comercial passou por ilhas Virgens Britânicas.
Este país está cheio de sacos azuis....
Há-os por todo o lado.......
Já denunciei alguns, só que há muitos castelos e bem fortificados...
E cobertores com papa ou sem ele são impenetráveis...
É fartar vilanagem!
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A implosão
Os prejuízos mais que muitos....
O crédito mal parado mais que muito....
E o depositante assiste impávido à subida vertiginosa dos custos de tudo e mais alguma coisa... até para abrir a porta!
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Parolos,
Pobreza,
Roubos
quinta-feira, março 09, 2017
Ponto de Vista
O
país assistiu recentemente, na esteira da publicação por Cavaco Silva de um
livro de memórias e da posterior reação pública de José Sócrates, a mais uma
daquelas novelas que nos permitem compreender muito do porquê da situação a que
Portugal chegou.
Cavaco
disse de Sócrates aquilo que se sabe, de que recordo em particular as
referências aos negócios com a Venezuela e com a PT. Com acusações de deslealdade
e outras pelo meio, colou a José Sócrates uma imagem muito pouco recomendável
para posterior registo histórico.
José
Sócrates respondeu na mesma moeda, falando, entre outras coisas, em
“bisbilhotice política”, “falta de sentido de estado”, “ataques políticos
traiçoeiros” e “deturpação de conversas”. Assim mesmo.
Para
o comum dos mortais ficou sobretudo uma lamentável imagem de dois políticos que
geriram o nosso destino em momentos cruciais da nossa história. De facto, é
impossível saber-se quem tem razão, ou sequer se algum deles tem razão. E mesmo
que acabássemos por concluir que algum tinha mais razão do que o outro, ou até que
a tinha toda, isso pouco importa. Fica-nos na mesma um amargo de boca, uma
espécie de sensação de vazio.
Com
toda esta polémica, a classe política desceu ainda mais baixo, quando muitos já
não acreditavam que tal fosse possível. Os portugueses estão hoje atolados em
dúvidas sobre a própria honorabilidade de José Sócrates e de Cavaco Silva,
decorrentes dos múltiplos escândalos cujas faturas nos vêm sendo sucessivamente
apresentadas, de que recordo as PPPs, o BPN, a PT, o BES, e a CGD, entre tantos
outros.
Numa
democracia madura, a prestação de contas a que se referiu Cavaco Silva teria de
respeitar duas premissas fundamentais: ser efetuada com transparência e, sobretudo,
acontecer na altura certa. Ora, não só persistem as dúvidas sobre o desempenho de
Cavaco em muitos dos dossiers a que me referi acima, dúvidas essas que o livro
não esclarece, como a revelação de conversas sem testemunhas, sobretudo nos
termos recorridos pelo ex-presidente da República, remetem claramente para um contexto
de óbvia conflituosidade política e pessoal como motivação para a mesma.
É
da praxe, até nos casamentos, que falemos na altura certa ou nos calemos para
sempre. Ao não ter falado quando devia, Cavaco demonstra não ter apreendido a
importância dos timings políticos. Quando presidente da República, ainda se
julgava no tempo em que foi primeiro-ministro. E, pelos vistos, hoje ainda se
julga um pouco presidente da República...
José
Sócrates, por seu lado, também não percebeu que os portugueses já não embarcam
em futebóis, de que é expoente máximo aquela galática piada destinada a
fazer-nos crer na generosidade milionária de um amigo desprendidamente generoso…
São
estes os personagens que arrastaram atrás de si multidões de crentes, como se
de uma simples profissão de fé se tratasse. O facto de ainda conservarem muitos
desses crentes explica muito do bloqueio a que a nossa democracia está sujeita.
Todos os sistemas políticos são modulados pelo nível de exigência dos cidadãos.
Se esse nível é baixo, se as pessoas adotam uma posição simplesmente clubística
em relação aos juízos que fazem sobre quem nos lidera, como tem tipicamente sucedido
no caso português, a qualidade do aparelho político é igualmente baixa e a
possibilidade de chegarem ao topo políticos com qualidades que mereçam um
consensual lugar na História é muito reduzida.
Quando
olho para trás, vejo sobretudo um passado de oportunidades perdidas, de
escolhas mal feitas, de colossais erros cometidos, enfim, tudo assente em
manipulação, desinformação, clubismo e hipocrisia q.b.
Já
Camões dizia que fracos reis tornam fraca a forte gente, máxima que não me
conforta quando dou por mim a pensar se essa própria “forte gente” será assim
tão forte. De facto, esta novela Cavaco contra Sócrates, ou vice-versa, é uma
espécie de sublimação daquilo que têm sido as nossas escolhas enquanto povo. No
mínimo, não augura nada de bom.
Muito bom dia a todos.
quarta-feira, março 01, 2017
Ponto de Vista
É
na faculdade de mentir, que caracteriza a maior parte dos homens actuais, que
se baseia a civilização moderna. Ela firma-se, como tão claramente demonstrou
Nordau, na mentira religiosa, na mentira política, na mentira económica, na
mentira matrimonial, etc... A mentira formou este ser, único em todo o
Universo: o homem antipático.
Actualmente,
a mentira chama-se utilitarismo, ordem social, senso prático; disfarçou-se
nestes nomes, julgando assim passar incógnita. A máscara deu-lhe prestígio,
tornando-a misteriosa, e portanto, respeitada. De forma que a mentira, como
ordem social, pode praticar impunemente todos os assassinatos; como
utilitarismo, todos os roubos; como senso prático, todas as tolices e loucuras.
A
mentira reina sobre o mundo! Quase todos os homens são súbditos desta
omnipotente Majestade. Derrubá-la do trono, arrancar-lhe das mãos o ceptro
ensaguentado, é a obra bendita que o Povo, virgem de corpo e alma, vai
realizando dia a dia, sob a direcção dos grandes mestres de obras que se chamam
Jesus, Buda, Pascal, Spartacus, Voltaire, Rousseau, Hugo, Zola, Tolstoi,
Reclus, Bakounine, etc. etc. ...
Estas
palavras não são minhas, são de Teixeira de Pascoaes, na sua obra "A
Saudade e o Saudosismo", mas enquadram na perfeição a forma como a
administração da ULS da Guarda lidou com o recente caso da alegada morte de uma
bebé na nossa maternidade.
Numa
primeira fase essa administração convocou uma conferência de imprensa para
anunciar inquéritos conduzidos por autoridades exteriores ao hospital,
procurando fazer-nos acreditar numa investigação objetiva e transparente. No
entanto, foi o próprio ministério da Saúde, entidade que não deixa de ser parte
interessada no problema, sobretudo se houver indemnizações cíveis em causa, a
envolver-se através da ARS do Centro. Por aí se começou a suspeitar das
dificuldades em se chegar afinal à verdade.
Para
confirmar essas suspeitas, a administração não só assumiu dificuldades em
fornecer à Polícia judiciária as filmagens das câmaras de vigilância, como comunicou
ao Ministério Público o desaparecimento do primeiro registo dos batimentos
cardíacos da mulher que perdeu o bebé por alegada falta de assistência. Tal
dificulta enormemente o apuramento da verdade e faz tombar sobre a ULS a
suspeita de encobrimento. Sejam quais forem os desenvolvimentos seguintes, isto
é, mesmo que alguém encontrasse o que se julga ser o registo desaparecido,
todos suspeitaríamos da sua veracidade. Já ninguém acreditará nas conclusões de
um qualquer inquérito que eventualmente ilibe a instituição das
responsabilidades que as circunstâncias atuais aparentemente lhe atribuem.
Para
esta consequência muito contribuiu o facto de o próprio diretor clínico da
instituição nunca ter dado a cara em todo este processo. Simplesmente
desapareceu de cena, atitude no mínimo bizarra e desconhecida em qualquer outra
situação comparável de qualquer outro hospital, e no máximo de uma
indescritível falta de solidariedade institucional e denunciadora da implosão
funcional da liderança hospitalar.
Recordo
que foi sob a tutela desta administração que alegadamente desapareceu uma
ampola de hélio indispensável ao funcionamento do aparelho de ressonância
magnética e que ocorreu um escândalo sobre fuga de radiações num aparelho da
TAC a funcionar ilegalmente, entre muitos outros eventos e cenas que nunca
deveriam ter existido.
Todos
estes factos revelam a incúria e a incompetência que têm presidido aos destinos
do nosso hospital, desprestigiando por tabela quem honradamente trabalha
naquela instituição em prol de todos nós. As perguntas que se colocam numa
altura destas são curtas e boas: quem tem medo da substituição imediata da
administração do nosso hospital? Quem tem medo do apuramento de todas as
consequências dos factos ocorridos? Será que, mais uma vez, a culpa vai morrer
solteira?
Muito
bom dia a todos.
(Crónica na Rádio F - 27 de Fevereiro de 2017)