sexta-feira, abril 27, 2012

Gostei de ler


Os elefantes que paguem a crise.

Perante uma situação difícil, o rei fez o que qualquer grande estadista faria e tomou a única decisão possível: foi caçar elefantes para África. Sim, todos os dias o desemprego aumenta e o nível de vida diminui, mas os espanhóis podem estar descansados porque há um paquiderme no Botswana que não se vai ficar a rir.
Espanha está mergulhada numa das mais graves crises da sua história. Perante uma situação tão difícil, o rei fez o que qualquer grande estadista faria e tomou a única decisão possível: foi caçar elefantes para África. Sim, todos os dias o desemprego aumenta e o nível de vida diminui, mas os espanhóis podem estar descansados porque há um paquiderme no Botswana que não se vai ficar a rir. É interessante constatar o modo como a análise económica muda de país para país. Em Portugal, culpamos Sócrates, o BPN, os mercados, as agências de rating. Em Espanha, descarregam nos elefantes da África austral. A crise tem responsáveis cada vez mais inesperados.
A caça ao elefante tem tudo para ser um desporto emocionante. A dúvida constante de saber se o praticante terá pontaria suficiente para conseguir acertar num bicho que, além de ter uma excepcional capacidade de se camuflar, ainda é extremamente irrequieto, deve ser de cortar a respiração. Mas o rei, habituado a não conseguir obter nada facilmente, aprecia desafios trabalhosos.
Dias antes da caçada, um neto do rei de Espanha disparou uma espingarda sobre o seu próprio pé. Trata-se de uma actividade que costuma ser levada a cabo apenas em sentido metafórico, mas o jovem infante resolveu ser literal e enfiou uma chumbada no metatarso. Ambos os casos fazem dos Bourbon guerreiros sui generis. O velho escolhe como alvo um animal que se move com lentidão e pesa toneladas; o miúdo dá um tiro e acerta no próprio pé. Não admira que tenhamos ganho tantas batalhas a esta gente. A família que teve a audácia e a valentia suficientes para subjugar o povo espanhol ao seu poder exibe a vocação genética para manusear armas que ficou descrita acima. Imaginem o talento do resto da população para a actividade bélica. É um país inteiro que deve ser dado como inapto para o serviço militar. Era óbvio que um povo assim só podia produzir soldados como os que, em Aljubarrota, no ano de 1385, claudicaram perante uma das nossas melhores profissionais da indústria da panificação. O que é incrível não é o facto de Portugal ter conseguido resistir às investidas espanholas. É Portugal não ter organizado um exército composto por meia dúzia de padeiras que alargasse as nossas fronteiras até França. Era trabalho para duas ou três semanas.

in Visão, Quarta feira, 25 de Abr de 2012