Se é por imposição dos donos do setor privado da saúde, que somam lucros de forma exponencial à custa do SNS, como é o caso da Luz cujos lucros subiram para 31 milhões de euros e da
CUF que viu os seus lucros atingirem os 43 milhões de euros, então muitas outras questões se levantam.
Desde logo os privados não despendem qualquer dinheiro na formação dos profissionais da saúde, salvo aquilo com que contribuem para o bolo geral dos impostos, de onde são depois retirados os vencimentos e outras despesas do estado com os profissionais de saúde. A formação, toda ela, é do setor público, percebem? Por outro lado, lembrar que uma fatia significativa dos “clientes” das unidades privadas da saúde resulta dos subsistemas, como o caso da ADSE, uma espécie de seguro autónomo dos funcionários públicos, para o qual estes descontam quase 4% do seu vencimento mensal. Acresce que o setor privado da saúde beneficia, também ele, da investigação farmacêutica que só em menos de 5% é privada, sendo o restante pago com o dinheiro de todos nós. Ainda por cima, aos beneficiados não interessa tudo. Preferem bife do lombo aos ossos e, assim, têm toda a sua estrutura produtiva orientada para as patologias ditas de “linha de montagem”, ou seja, aquelas que dão lucro e rápido retorno dos investimentos. Tudo o resto, tudo aquilo que só dá despesa sem retorno e chatices sem fim… fica para o estado!
O que ressalta claramente de este quadro é que os privados aplicam como ninguém aquela velha máxima de “o que é meu é meu, o que é teu é nosso”. O que não podemos esquecer é que, no fundo, somos todos nós, os contribuintes, sãos ou doentes, que sustentamos este sistema, incluindo naturalmente os privados e os seus lucros. O poder destes não consiste no trabalho, assenta à partida no facto de serem donos dos hospitais e terem quatro partidos que os apoiam: PS, PSD, IL e Chega. A cerejinha no cimo do bolo é a ineficácia do estado em fazer funcionar bem o Serviço Nacional de Saúde.
Ora, com esta ministra as coisas não melhoraram. Logo, a sua manutenção só se pode justificar pela necessidade estratégica de se manterem as condições que têm conduzido àquilo que
todos vemos, com os privados a baterem palmas à situação. Para eles, quanto pior melhor! É a política do recurso à linha 24, com desumanização e incompetência totais, atoladas no aconselhamento de serviços encerrados, de deslocação de parturientes para hospitais a quilómetros de distância, de partos nas ambulâncias, encerramentos de urgências, nomeação dos Conselhos de Administração por critérios partidários, e agravamento dos números de portugueses sem médico de família. E isto só pela rama.
Nunca a saúde foi tão negócio como é hoje! As Corporações da Saúde, das quais a dos médicos é a mais preponderante e poderosa, mas igualmente a farmacêutica, de onde veio a ministra,
adaptam-se como ninguém a esta espécie de darwinismo comercial. Para eles qualquer solução é boa, desde que permita a sua sobrevivência e dos interesses que defendem. Tanto pode ser com os privados, como com um estado que não funcione bem. No fim, ganham sempre!
A História ensina-nos que nunca um sistema mudou para benefício de todos a partir de dentro. O papel da política é o de promover essa evolução sem necessidade de ruturas ou revoluções, muitas vezes – também elas – prejudiciais à obtenção de algo melhor. Quando a política se torna refém de interesses de elites e de grandes grupos económicos, já não é a saúde dos portugueses que está em perigo, é a saúde da própria democracia. Se não andarem demasiado mal da cabeça, pensem nisso.
Não faz mal a ninguém, não dá lucro a quem não deve tê-lo, e não aumenta as listas de espera!
(Crónica Jornal "O Interior" 9 de junho 2025)