O passado esquecido pela inércia e pelo desconhecimento
No dia 2 de maio de 2025 o que já muitos cidadãos temiam aconteceu - um edifício adquirido pelo atual executivo da Câmara Municipal da Guarda ruiu em pleno Centro Histórico.
Nada, mas mesmo nada, que não fosse já previsível. Aliás, muitos cidadãos, pelo menos os que civicamente se preocupam com o legado que nos foi deixado pelos nossos antepassados e que deveria merecer o maior e melhor dos respeitos já tinham alertado o executivo camarário para a situação que vai a acontecer no Centro Histórico da Guarda.
Continuo a afirmar que quem não sabe de onde veio, onde está dificilmente pode pensar no futuro. E pior, povo que não respeita o seu passado está condenado a repetir o pior da sua História.
Se houvesse memória, que não há, bastaria recordar o muito que a História da cidade da Guarda deve a todos os que com sangue, suor e lágrimas construíram um local de defesa e de vigia contra invasões, saques e conquistas de outros povos. Bem como o refúgio daqueles que não se conformaram, nem nunca aceitaram pelo menos declaradamente o apoio real, acéfalo, cretino e imbecil a uma Contra Reforma que contribui e muito para o atraso civilizacional dos povos. Estudem!
Importa e é justo referir que muito de mal que se foi a realizar no Centro Histórico da Guarda tem antecedentes em executivos camarários mais antigos. Quem já esqueceu a construção de uma vivenda, com piscina dentro da muralha? Quem se pode esquecer da colocação de contadores de água e da eletricidade em imóveis recuperados, muitos deles a muito custo pelos próprios donos? Um desrespeito, mais um, a juntar a tantos outros. Obras inacabadas, a recolha deficitária do lixo, a falta de segurança, nomeadamente em termos de incêndio, a limpeza das ruas, enfim uma enormidade de problemas que foram a ser exponencialmente aumentados com o decorrer do tempo, sem que uma intervenção séria fosse feita.
Para os mais jovens e para lembrança dos menos jovens dizer que o imóvel que ruiu no Centro Histórica da Guarda, que se situava, na Rua Augusto Gil, devoluto há alguns anos, funcionou em tempos como a Auto garagem da Sé, e antes albergou a antiga Igreja de Santa Maria do Mercado e foi depois um teatro da cidade. Este e o restante passado devia merecer do executivo camarário o maior e melhor dos respeitos. Não houve nem há! Recordar que o edifício em questão foi adquirido em 2022, já lá vão quase três anos, pelo executivo camarário por 225 mil euros. E a sua degradação foi-se a acentuar. Desleixo total de um património adquirido pelo dinheiro dos contribuintes. Sim, é bom lembrar a certa gente que a Câmara não tem fundos próprios. Apenas e tão-só os resultantes dos impostos dos cidadãos e do pagamento, bem avultado, de serviços que realiza aos mesmos. Dizia o executivo, na altura na aquisição do imóvel, que o mesmo serviria para a instalação de um «novo equipamento cultural».
Em três anos nem sinal do projeto e muito menos a concretização da promessa. Mas de promessas não cumpridas os cidadãos da Guarda já estão mais que habituados. Só promessas para enganar incautos. Curiosamente, ou talvez não, anuncia-se mais um plano, este de Revitalização do Centro Histórico. Coincidências? Quem acredita nelas? Eleições à porta! Uma cidade, e um concelho, cada vez mais votado ao abandono, ao vandalismo, ao desrespeito pela vida amarga dos que estoicamente ainda por cá vão a ficar. Haja, pelo menos, respeito pelo nosso passado histórico. Pedir muito?
(Crónica Jornal O Interior - 12 de maio 2025)