Deu
recentemente à estampa um estudo encomendado pela Presidência da República e
realizado pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, sobre
os jovens em Portugal. Os resultados desse estudo só podem espantar quem não
conhece a realidade.
Desde
logo, cerca de 70% dos jovens entre os 15 e 24 anos encaram a hipótese de
emigrar. E 57% dos jovens na mesma faixa etária não se interessam “nada” por
política. Quando colocados perante a afirmação “daqui a dois anos, a crise terá
terminado e a situação do emprego em Portugal será melhor do que hoje”, a
maioria dos jovens discordou, variando essa discordância entre 61% nos mais
novos e 67% nos mais velhos.
Suspeito
que as referências desta juventude em relação à política se coligam inevitavelmente
com os casos de aldrabice, de corrupção e de ascensão meteórica na política que
têm invadido o nosso quotidiano. E suspeito que essas referências têm tudo a
ver com os resultados deste estudo.
Num
tempo em que se dedicam hossanas a gatunos e a gente que nunca serviria de
exemplo num país minimamente equilibrado, é mais fácil entender esta atitude
dos nossos jovens. Sobretudo se atendermos ao facto de, pelo meio, a proporção
de jovens sem trabalho há mais de um ano variar entre os 38% nos mais novos e
os 53% nos mais velhos.
Este
conjunto de dados, profundamente elucidativo e inquietante, reflete a falta de
confiança num futuro por cá e faz emergir a indisponibilidade da juventude para
acreditar num sistema que se recusa a promover mudanças com resultados
palpáveis ao nível dos desequilíbrios sociais que se vão acentuando.
Ao
contrário da pífia mensagem política que o governo tentou fazer passar, a
emigração jovem não ocorre por opção livre em busca de um futuro melhor, mas
sim por uma desesperada necessidade de sobrevivência. Essa emigração não é um
desígnio em si mesmo, é uma fatalidade incontornável. Representa um drama para
as famílias e acrescenta débitos sociais a um futuro nacional já de si comprometido
por diversas e más razões.
No
contexto de uma taxa de natalidade quase idêntica à dos dinossauros que
pereceram há 65 milhões de anos, a emigração jovem atual, somada a um
desemprego claramente inibidor de circunstâncias propiciadoras à constituição
de uma família, é uma faca apontada ao coração da Segurança Social e da
estrutura sociológica e identitária de Portugal daqui a 20 anos.
Talvez
os jovens se tenham apercebido, nem que seja de forma subconsciente, que o
sistema político atualmente instalado apenas olha para os seus problemas numa
perspetiva de curto prazo. Quando muito, tudo é equacionado a pensar nas
eleições que estiverem mais próximas. A partidocracia não consegue lidar com
problemas que estão para o futuro do nosso país como a tectónica de placas está
para a geografia. Há coisas que acontecem lentamente, muito lentamente, mas cujos
impactos são implacáveis. As variações da nossa natalidade, em queda permanente
há décadas, são uma delas. Para os políticos, é como se não acontecessem.
O
sistema partidocrático atual é incapaz de sacrificar hoje o que quer que seja,
em nome de um bem comum daqui a 20 anos. Pelo contrário, sacrificará sem
hesitações o bem comum do futuro a favor de um qualquer ganho político imediato
e fugaz. Esta é a fraqueza da nossa democracia e não é preciso termos grande
cultura política para nos apercebermos disto.
Desenganem-se
aqueles que pensam que os jovens se afastam da política por desconhecimento ou por
ignorância. Isso seria confundir causa com consequência. Os jovens afastam-se
da política porque a veem como a mãe de todos os males que hoje os afetam. E
isso, em termos históricos, é como se a seiva de uma árvore se recusasse a
alimentar as raízes da mesma.
Não
sei se Cavaco Silva algum dia perceberá as enormes responsabilidades que tem
neste estado de coisas. E que não é com estudos destes que se lava a
consciência. Se ele a tiver claro. Tenham um bom dia.
(Crónica na rádio F - Ponto de Vista - 18 de Maio de 2015)