O
nosso hospital voltou a ser notícia pelas piores razões. Depois dos diversos
escândalos protagonizados pelos conselhos de administração presididos,
respetivamente, por Fernando Girão, Ana Manso e Vasco Lino, eis que foi agora divulgada
uma notícia relatando o uso indevido de uma base de dados pertencente à instituição
para, através do seu correio eletrónico, divulgar as jornadas distritais de
saúde promovidas pelo PSD.
A
promiscuidade entre o que é Estado e o que é atividade partidária já não é de
agora. Recordo-me, por exemplo, de um destacado dirigente local do PSD ter,
durante as últimas eleições legislativas, utilizado uma base de dados da Agência
de Desenvolvimento para a Sociedade da Informação e do Conhecimento para enviar
e-mails a anunciar a realização de um comício na Guarda, com a presença de
Passos Coelho.
O
problema deste tipo de disparates reside no facto de tenderem a tornar-se
rotina. E Carlos Rodrigues, o novel presidente da ULS, pelos vistos não escapa
à regra. Quando chegou à Guarda, deparou-se com algumas situações absolutamente
caóticas que transitaram das governações anteriores. O facto de o atual diretor
clínico, Gil Barreiros, provir dos cuidados primários, em linguagem corrente,
dos centros de saúde, e de já ter integrado a administração anterior e por essa
via dado provas de uma total incapacidade para compreender os meandros de
alguns delicados dossiers
hospitalares sem qualquer relação com os cuidados primários, não ajuda Carlos
Rodrigues a lidar com a tarefa hercúlea que tem pela frente.
Como
se já não bastassem os problemas relacionados com a falta de médicos, há
serviços da ULS que ameaçam implodir. O caso da cirurgia é o mais evidente.
Durante anos as diversas administrações acumularam erros relativamente aos planos
estratégicos e às escolhas para a direção do serviço. O resultado foi a
retirada, pela Ordem dos Médicos, da idoneidade do serviço para formar
cirurgiões e a proibição da realização de certo tipo de cirurgias.
Em
vez de enfrentar o problema com olhos de ver e escolher para dirigir o serviço,
de entre as opções disponíveis, a menos má, a administração anterior a que já
pertencia Gil Barreiros, escolheu a pior: mandou vir um cirurgião de fora, mais
concretamente do hospital de São João.
O
problema é que o processo decorreu com total violação da lei e agravou de forma
notória os conflitos já existentes. Se Gil Barreiros tivesse regado o fogo com
gasolina e lhe atirasse depois um saco com pólvora não teria obtido melhor
efeito. O cirurgião em causa, de seu nome António Ferrão, dedicou-se, logo que
chegou do Porto, a ferrar disparates atrás de disparates, encontrando-se por
essa razão envolvido em nada menos que quatro processos judiciais, um deles já
com proposta de condenação e dois outros com julgamentos agendados para dentro
de poucos dias.
Como
uma desgraça nunca vem só, num desses processos judiciais António Ferrão
arrastou mais oito colegas para o abismo, pelo que iremos assistir, a partir de
junho, ao julgamento em simultâneo de nove, repito, nove médicos de um mesmo
serviço pela prática de crimes dentro da instituição!
A
tragédia de tudo isto é que Gil Barreiros, um dos maiores responsáveis pela
situação criada, em vez de ter sido demitido, como sucedeu com Vasco Lino, foi
recompensado com a acumulação de cargos e com um aumento visível do seu poder. Compreende-se
por isso que só tenha deixado cair António Ferrão depois de a IGAS o ter
obrigado a tal...
Mas
como o erro é para certa gente uma tentação irresistível, a administração
presidida por Carlos Rodrigues prepara-se para, de acordo com as notícias
vindas a público, nomear como responsável da cirurgia Augusto Lourenço, o
médico que conduziu o serviço à lamentável situação em que se encontra e que,
para mais, corre o risco de vir a ser condenado por crime no exercício de
funções. Assim, as cenas dos próximos capítulos prometem ser de faca e alguidar.
Tudo em nome das birras a que as administrações da ULS já nos habituaram nos
últimos anos.
Tenham um muito bom dia!
(Crónica na Rádio F - 25 de Maio de 2015)