sábado, janeiro 28, 2023

Ponto de vista

Inicio esta crónica recordando um dos nossos mais importantes escritores do século XX – Aquilino Ribeiro.
Era um cidadão do mundo, mas as raízes da terra nunca lhe largaram os tornozelos, a sua, a nossa Beira Alta que tanto amava.
Escolhi uma obra de Aquilino Ribeiro para situar tudo o que mais à frente direi sobre acontecimentos que se foram sucedendo, aqui pela nossa Guarda.
A obra de Aquilino Ribeiro de que me socorri foi “Quando os Lobos uivam”. Em 1958, Aquilino Ribeiro escreveu a saga dos beirões da Serra de Milhafres, a quem, na década de 40, durante o Estado Novo, foi imposta a perda dos baldios. Em seu lugar, plantariam pinheiros, o que prometia fortuna ao Estado e fome aos que na serra encontravam sustento. Alimentando a metáfora do nosso escritor, viveu-se uma caça aos lobos para incrementar o número de cães.
O desejo do regime era enriquecer os cofres com a transformação das culturas da serra, por muita injustiça que tal empresa arrecadasse, por muito de bom que se perdesse, por muita gente que morresse na defesa das suas vidas com cabeça erguida mas com coluna bem vertical.
Assim situados pela obra de Mestre Aquilino, vamos aos factos da nossa região. Para início de conversa, foi anunciado que a linha da Beira Alta não reabriria no dia 14 de Janeiro, como foi prometido. Vamos ter de esperar pelo menos até Novembro, espera-se e deseja-se que do presente ano. São mais 10 meses à espera da dita reabilitação. Até lá o ministério das infraestruturas, entre derrapagens, indemnizações e milhões na TAP, vai sufocando o país.
Depois, tivemos a inauguração, com pompa e circunstância, de uma nova Unidade Familiar de Saúde designada por Carolina Beatriz Ângelo. À inauguração faltaram elementos do governo. Não se viu nenhum. Nem a ministra da Segurança Social, a tal que tudo faz para aparecer em fotografias de inaugurações, se deu ao trabalho de querer descerrar a placa. Desta inauguração o que mais espanta é que se utilizem as instalações de um Centro de Saúde, já a funcionar, para se abrir uma nova unidade. Porque razão não se instalou a nova Unidade de Saúde num dos vários imóveis públicos que por aí se encontram vazios, nomeadamente nos que foram adquiridos pela autarquia, a maior agência imobiliária do concelho? Estranha-se ou talvez não. Esta nova Unidade de Saúde representa, contudo, uma ténue prova de vida da Unidade Local de Saúde da Guarda. Pelo menos ouvimos João Barranca, o presidente da instituição, dizer que é impossível fechar a única maternidade do distrito. E que tudo está a ser feito para que sejam mitigados eventuais futuros constrangimentos no bloco de partos da maternidade do Sousa Martins.
Pena que se tenha sabido esta semana que há 5 000 cidadãos sem médico de família na área de abrangência da mesma ULS. Só no concelho da Guarda, são 3 000.
No meio de todo este cenário, João Barranca não deu qualquer explicação para o facto de o erário público continuar a ter de suportar o aluguer da outra Unidade de Saúde Familiar, a Ribeirinha, à Santa Casa da Misericórdia.
E não sendo já um assunto seu, também mais ninguém explicou quando é que termina o aluguer, ainda à mesmíssima Santa Casa da Misericórdia da Guarda, das instalações onde precariamente funciona o Conservatório de música.
Esclareça-se que este aluguer é pago na forma de subsídio doado pela Segurança Social à Santa Casa da Misericórdia, com o cabimento de «Apoio a actividades culturais», desconhecendo-se de o mesmo direito se aplica no caso de surgir um qualquer outro projecto concorrencial com o do actual Conservatório!
Outro acontecimento que ocorreu na Guarda e teve honras de presença de ministros, da Economia e da Segurança Social, foi a integração do Hotel Turismo no Grupo Pestana/Pousadas de Portugal. Finalmente, após 12 anos de total abandono e de falsas promessas de venda e leilões falhados, o Hotel Turismo reabrirá lá para 2025.
Diz-se.
E para final, ainda mais uma nova promessa. A Pousada da Juventude vai reabrir. Ao fim de 11 anos encerrada, e pelo meio com promessas de outros destinos, como sede do Comando Distrital da PSP ou residência de estudantes, que não se concretizaram, parece que vai haver novamente Pousada da Juventude. Anuncia-se a abertura para finais de Junho. Esqueceram-se de um pormenor. Não disseram o ano.
Tudo isto, a pequenez da Guarda aliada à situação esquizofrénica em que mergulhou a nossa política nacional, deixa-me uma sensação de mau presságio, uma espécie de pesadelo que se abate sobre a Guarda.
Ontem foram os baldios que determinaram a saga dos beirões.
Hoje são promessas quantas delas transformadas em desilusões que nos querem fazer crer que há um caminho para fugirmos a este destino fatal.
Como já disse mais vezes, muita gente deu para este peditório, através da partidarite local e de outras tristezas. Espero que estejam satisfeitos.
Tenham uma boa semana.