Depois
da ceia...
Depois
da ceia, o pessoal, extenuado, esfarrapado e imundo, cabeceava pelos cantos,
ainda à espera de mais trabalho.
Ganho
o dia aos cestos, era preciso ganhar a noite no lagar, num chouto que a
princípio dava gosto e alegria, e se prolongava numa tortura desesperante.
O
sono parava os nervos e os músculos, e a vontade tinha de protestar, de
combater, de movimentar à sobreposse as articulações, mais perras que
dobradiças enferrujadas.
Às
tantas, erguer uma perna tornava-se um sacrifício…
O
resto do corpo quase que desanimava perante a obstinada renúncia daquela
parcela amortecida, inerte e pesada na espessura do mosto.
Mas
tudo na vida acaba, e a penitência não fugia à regra.
Medida
no relógio do Jacinto, com rigor de quem pesa oiro, a hora almejada de despegar
chegava finalmente.
E,
num automatismo resignado, lá iam procurar na palha forças para o dia seguinte.
MIGUEL TORGA, Vindima, XXXIV, princípio.
(O outro lado do acto de vindimar que não aparece nos roteiros turísticos!)