quinta-feira, junho 09, 2022

Ponto de vista

Um dos assuntos que tem dominado a opinião pública é o que diz respeito aos chamados Metadados. Importa clarificar muito do que se vem dizendo sobre o tema e esclarecer certos aspectos que propositadamente são apenas ruído para que os cidadãos não sejam devidamente esclarecidos sobre o assunto. Ora, a 13 de Julho de 2005, na sua declaração condenando os ataques terroristas em Londres, o Conselho Europeu reafirmou a necessidade de aprovar o mais rapidamente possível medidas comuns relativas à conservação de dados de telecomunicações. E eis que surge a directiva 2006/24/CE DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 15 de Março de 2006 e onde foram definidas as disposições dos Estados-Membros relativas às obrigações dos fornecedores de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis ou de uma rede pública de comunicações em matéria de conservação de determinados dados por eles gerados ou tratados, tendo em vista garantir a disponibilidade desses dados para efeitos de investigação, de detecção e de repressão de crimes graves, tal como definidos no direito nacional de cada Estado-Membro. Estava aberta a porta para os Estados Membros espionarem os chamados Metadados. Mas o que é isso de Metadados? Importa clarificar, de uma vez por todas, a muita confusão que é lançada sobre a opinião pública pouco ou nada dada a estas coisas das novas tecnologias. Metadados são definidos como os dados que fornecem informações sobre um ou mais aspectos dos dados. Por exemplo, quando alguém usa o seu telemóvel para tirar uma fotografia ela pode incluir metadados. Que descrevem dados como o tamanho da imagem, a sua profundidade de cor, a sua resolução, quando foi criada, como foi obtida e o seu autor. Já os metadados de um documento de texto podem conter informações sobre a extensão do documento, quem é o autor, quando o documento foi escrito e um breve resumo do documento. Igualmente os metadados nas páginas da Web também podem conter descrições do conteúdo da página, bem como palavras-chave vinculadas ao conteúdo. Mas os metadados também dizem respeito a comunicações telefónicas e de internet identificando o utilizador do telefone ou do computador, a duração e o destino das chamadas e a localização. E, para que a espionagem fica-se mais completa, os metadados podem ser armazenados e gerenciados numa base de dados, geralmente chamado de registo de metadados. Aqui chegados e balizadas pelo Conselho e o Parlamento Europeu o âmbito da espionagem à privacidade do cidadão logo se levantaram vozes a exigir a revogação da dita directiva. E, em 2014 a diretiva era "chumbada" pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, alegando a desproporcionalidade e invasão da privacidade dos cidadãos que tinham um vasto conjunto de dados das suas comunicações guardados, incluindo o local onde se encontravam, sem serem sequer suspeitos de crimes. Com base na decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia, a Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, requereu ao Tribunal Constitucional uma fiscalização da legislação e o entendimento do Tribunal foi a declaração de inconstitucionalidade, que é retroativa à data da criação do diploma em 2008. Os conselheiros nem sequer limitaram os efeitos da sua decisão, como manter, por exemplo, o acesso, pelo menos, aos chamados "dados base", identificação e morada do dono do telemóvel ou do IP do computador, por exemplo, cujo acesso, ironicamente, é agora só autorizado às secretas. As escutas continuam, no entanto, a ser permitidas, mas todo o histórico essencial para a descoberta da verdade de um crime fica barrado. E a bomba caiu sobre a Justiça. A inércia, inépcia e a posição horizontal de todos os poderes em Portugal desde o legislativo, executivo e judicial podem permitir que milhares de processos venham a ser considerados nulos. Os casos julgados ou por julgar mas que utilizaram os metadados. Mas, para além da limpeza dos processos ninguém fala das indemnizações que podem vir a ser pedidas. Uma catástrofe anunciada. É caso para dizer que saiu a sorte grande a muitos bandidos. E, eis que o caricato mais uma vez acontece neste nosso país. É que estranhamente as operadoras podem continuar a guardar a mesma informação de todos os seus clientes durante seis meses para efeitos de faturação e não se pode utilizar a mesmíssima informação para investigar crimes muito graves. É bom lembrar que se os dados relativos às comunicações das vítimas forem apagados, findas que sejam tais comunicações, poderá ser muito difícil identificar os agentes dos crimes o mesmo acontecendo com toda a criminalidade que é praticada com recurso a meios informáticos e de telecomunicações eletrónicas. Todos sabemos pelos antecedentes e consequentes dos vários casos quem vai sair beneficiado. Tudo por culpa de um aparelho político amorfo e cúmplice. Foram catorze anos em que se ignoraram estes casos dos metadados. Nada a espantar neste Portugal. 
Tenham uma boa semana.