Ao iniciarmos mais uma série de crónicas neste ano de 2023 queremos desejar a todas e a todos os que nos ouvem um Ano Novo com muita saúde e que se concretizem todos os vossos projectos.
São os nossos sinceros votos.
O facto político que indubitavelmente marcou os últimos dias de 2022 foi o caso Alexandra Reis. Tanto o ministro das Finanças como Pedro Nuno Santos estão a querer atirar areia para os olhos dos portugueses. O ex ministro das Infraestruturas assegurava aos portugueses, há dois anos, quando começou a injetar milhares de milhões de euros na TAP que a empresa ia ser do interesse público e que o Estado ia mandar nela. Mas o Estado não só não manda, como não faz ideia do que se passa lá dentro. Tudo a acontecer numa empresa que já recebeu 3,2 mil milhões de euros dos contribuintes e que se obrigou, em vassalagem completa, a aceitar um plano da Comissão Europeia em troca da cedência de 18 slots no aeroporto de Lisboa a empresas estrangeiras, e a vender as participações na Manutenção & Engenharia Brasil, Cateringpor e Groundforce e a aceitar o tal plano de reestruturação baseado em despedimentos e redução de vencimentos. Mas a saída de Alexandra Reis levanta várias dúvidas que persistem. Como é que os dois ministros da tutela não sabiam do processo de saída da TAP e da indemnização? Como é que depois de convidada a sair foi nomeada para dois cargos públicos? E como é que ninguém avaliou os danos políticos desta embrulhada? Poucos meses depois de sair da TAP, Alexandra foi escolhida pela tutela – Ministérios das Infraestruturas e das Finanças – para presidir à NAV, a empresa pública que gere o espaço aéreo português. Por ali ficou mais uns meses até que Medina a nomeou como Secretária de Estado do Tesouro. Fica-se com a ideia que esta Alexandra se põe a boca no trombone cai o Carmo e a Trindade. Por fim, mas não menos importante, lembrar que a cessação do contrato da TAP com Alexandra Reis acontece em Fevereiro e só em vésperas de Natal, ou seja dez meses depois, é que um jornal decide publicar a notícia da milionária indemnização. Sem que antes um jornal dito de referência ter nomeado Costa como a figura do ano num país como Portugal. Alexandra Reis foi nomeada, por quatro anos, para a administração da TAP, em Setembro de 2020. Em Fevereiro de 2022, rescinde esse contrato e, por umas cláusulas que ninguém consegue ler, porque são confidenciais, tem direito a uma indemnização de 500 000 euros ao fim de 16 meses de trabalho? Numa empresa absolutamente vital para Portugal e com milhões de euros emprestados por contribuintes. Quem consegue entender? Como é que se explica a uma população onde três em cada quatro cidadãos recebem uma esmola pensando que é um salário? Como é que se explica a uma população que viu a prestação da casa aumentar com a subida da Euribor, e está em risco de a perder porque não tem mais 200 euros por mês? Como se explica a uma população onde os serviços públicos estão a definhar dia após dia? Como se explica a uma população que está na miséria com a inflação e a ganância dos que arrecadam lucros excessivos? O país está podre. Falta ética, transparência nos actos públicos, os princípios e os valores que deviam nortear a coisa pública são vendidos numa qualquer praça ou feira de vaidades. Governa-se, a todos os níveis, num regime de arrogância, de prepotência e de absoluta falta de vergonha. São trapalhadas com ministros que carregam incompatibilidades grosseiras, ministras que gerem fundos públicos que acabam nas empresas dos maridos, bazucas turísticas que desaguam em empresas de turistas espaciais, ministros da Saúde que dirigem empresas da mesma área, antigos e actuais directores de televisões a quem se paga favores, uma comunicação social vendida, secretários de Estado com processos de corrupção em tribunal que se acham atacados pela corte de Lisboa e como cereja no topo do bolo uma justiça corrompida. Quando ouço que “é tudo legal”, percebo que o primeiro problema está de facto na lei. Se o contrato de Alexandra Reis com a TAP é legal – e o seu percurso até ao Governo, passando pela NAV, absolutamente inatacável do ponto de vista da lei –, então é por aí que esta conversa deveria começar: pela lei. Não podemos continuar a respeitar leis que permitem o roubo descarado de dinheiro público com a culpa a morrer nos corredores do poder e sem nomes. Temos de ser um pouco mais inteligentes do que isto, mas também temos de exigir mais de quem nos governa. Temos de exigir responsabilidades. E sim, temos que começar a despedir gente, cortar as asas a alguns abutres e parar, de uma vez, com esta clientela que enriquece à nossa custa. O serviço público é importante e uma marca em qualquer país desenvolvido de primeiro mundo. Não podem existir mais Alexandras Reis, maiorias absolutas submissas ou uma população absolutamente miserável que luta por migalhas diariamente enquanto as elites se enchem à nossa custa. Não há justificação. Não há desculpa. E já não há paciência para tamanha corja de ladrões. O corpo legislativo há muitos anos não legisla. É uma representação e só isso. Representam a toda a hora a cada intervenção. Um palco de representações umas trágicas outras cómicas. Vem apenas a ser uma assembleia muda, sonolenta, ignorante abanando a cabeça «que sim». O executivo está paralisado. Não governa, não tem ideias, não tem sistema; nada reforma, nada estabelece; está ali é o que basta para os comensais do costume. E o dito garante da Constituição prefere banhos e viagens a exigir o cumprimento da mesma.
Tenham uma boa semana.