A Guarda celebrou mais um aniversário. O octingentésimo vigésimo sexto aniversário da atribuição do foral à Guarda pelo rei D. Sancho I, o rei povoador.
Os cartazes emanados da Câmara Municipal da Guarda trazem a figura do rei que outorgou o foral. Mais uma hipocrisia. Quando nos lembramos que a estátua do rei serve hoje de mictório a quadrúpedes e bípedes, retirada do lugar central que devia ocupar numa praça que alguns já apelidaram sala de visitas da cidade, diz tudo do que para certa canalha é a negação da História.
Um povo, manietado pela elite dos privilegiados, que desconhece o seu passado, não sabe onde está e desconhece o rumo a seguir para o seu desenvolvimento, está condenado a repetir a História agora não como tragédia, mas como farsa. Tudo, mas tudo falta de todas as aprendizagens. E ainda tivemos, para mais hipocrisia, uma parada militar junto à estátua do rei fundador. Esperemos que tenha havido a dignidade de limparem o espaço, pois o cheiro pestilento e nauseabundo que por lá vai a existir dá ainda um pior descrédito à hipócrita celebração. Apesar da falta de memória de alguns deixo os meus parabéns pelo aniversário a todos, mas mesmo a todos e em particular aos que estoicamente vão a resistir à debandada geral.
Mas não é apenas de comemorações que se faz a vida cívica pela Guarda. Ficou-se a conhecer, após cumprido o ato eleitoral das autárquicas, estranhamente e sem justificação plausível, o Relatório Oficial de Contas da Câmara da Guarda relativo ao primeiro semestre de 2025. Estranhamente só agora, após o período eleitoral. Onde fica a tal transparência tão apregoada? Digam claramente o que se passou. O Revisor de Contas atrasou-se? O executivo camarário quis esconder algo? Digam-no em prol da tal transparência. O povo tem o direito de saber como vai o despesismo na Câmara Municipal da Guarda. Exige conhecê-lo, é um direito constitucional. Bem sei que há uma lógica, historicamente predominante, na relação da população com o Estado, impregnada de apatia, clientelismo, submissão, populismo, cooptação e outros tantos efeitos perversos desta herança cultural. Há décadas que se diz que é necessária uma nova prática pedagógica planeada capaz de orientar o necessário processo de mudança de atitudes, valores, mentalidades, comportamentos, procedimentos, tanto por parte da população como daqueles que estão no interior do aparelho estatal. E desde logo essa aprendizagem deve ser feita a vários níveis na sociedade, no comportamento dos donos do poder e nas escolas. Mas, infelizmente, pouco se ensina e nada se aprende. O sentido crítico deve ser premiado e nunca servir de mote para ostracizar, excluir e condenar como é hábito. Pelo que foi anunciado, o relatório relativo à situação económica-financeira da Câmara da Guarda, elaborado pelo Revisor Oficial de Contas, tem data de 10 de setembro, mas só foi entregue aos vereadores dois meses depois, isto é depois do folclore das eleições autárquicas. Diz Sérgio Costa, que o relatório foi entregue a 10 de setembro ao executivo camarário e que até à última reunião do executivo a 22 de setembro não houve tempo para dar a conhecer o relatório aos vereadores. Espanto dos espantos. Houve duas reuniões do executivo camarário antes das eleições e nada de apresentar o relatório. Agora sabe-se que a situação financeira da Câmara da Guarda no final de junho era muito grave.
Só nessa altura? Em breve se saberá se não continua grave.
Diz-se que o resultado semestral do exercício camarário é francamente negativo, atingindo um aumento de, 343% relativamente ao período homólogo do ano passado. E o que já se suspeitava confirma-se. Os gastos com pessoal cresceram mais de 1 267 000 euros em apenas seis meses, face ao período homólogo do ano anterior. Assim sendo, os gastos com o pessoal já representam 58% do total dos custos operacionais, mais 11% do que no período homólogo — um desequilíbrio grave que pressiona o orçamento municipal.
A resposta do presidente da Câmara da Guarda, reeleito agora na coligação PPM e Nós Cidadãos, rejeita tal descalabro com o facto de haver fundos europeus a serem recebidos. O que isso tem a ver com os aumentos exponenciais de funcionários camarários e do preço da água e das taxas e taxinhas?
Para o circo ser mais ridículo que dizer da proposta do presidente da câmara em criar “Colares Cerimoniais” chamados também “cordões protocolares de mandato”, iguais aos que há na câmara de Lisboa? Em que o cordão do presidente é em ouro e o do presidente da Assembleia Municipal e vereadores são em prata. Não haverá mesmo mais nada a tratar de interesse para os munícipes para além de cordões para os da elite? Só pode ser caricato e burlesco.
Tudo isto pouco ou nada parece importar à maioria dos guardenses. Venham as festas, corridas com prémios chorudos, carroceis, cidade Natal, muita luz, música celestial para os ouvidos dos que se encantam com um qualquer ilusionista. É o Natal e depois a Alta Passagem de Ano. É o circo do costume. E no final vamos todos pagar o despesismo.
Tenham uma excelente semana.
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