A falperra continua a sua senda de ajudar os poderes, todos eles, e lesar os mais fracos, os que com sangue, suor e lágrimas pagam os devaneios das elites governativas.
O caso em apreço tem a ver com a célebre venda das barragens do Douro pela EDP à francesa Engie há mais de 3 anos.
Isso mesmo, há mais de 3 anos.
Agora ficou-se a saber que a Autoridade Tributária deixou caducar o direito à liquidação do IMI, de 2019, relativo a mais de 160 barragens em todo o país.
Em todo o país, saliente-se!
Em Fevereiro de 2023, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Félix, emitiu um despacho a obrigar a Autoridade Tributária a avaliar e a inscrever nas matrizes os equipamentos de todos os aproveitamentos hidroelétricos com vista à cobrança do IMI. Só que veio tarde, porque, mesmo assim, a Autoridade Tributária deixou caducar o direito à liquidação desse imposto, relativo a 2019, uma vez que o mesmo seria retroativo aos últimos quatro anos.
Em Outubro, o mesmo secretário de Estado Nuno Félix reiterou junto da Autoridade Tributária que a mesma devia avançar com todos os procedimentos para cobrança do IMI e referiu que tem “o especial dever de liquidar e cobrar os impostos que sejam devidos, nos termos da lei”, “sem deixar de reservar o recurso aos seus poderes de autoridade face aos contribuintes que recusem cumprir as suas obrigações, ainda que estes últimos recorram à litigância”.
A “exigência” do secretário de Estado tinha como base um parecer da Procuradoria-Geral da República de 2006.
Mas o jogo das sombras continuou…
Um secretário de estado pedia à AT o cumprimento da lei, e esta fazia orelhas moucas!
Assim, as “ordens” do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais foram, imagine-se, inconsequentes.
Apenas mereceram da Autoridade Tributária um conjunto de dúvidas. Não houve qualquer reacção eficaz por parte da Autoridade Tributária, apenas o bocejar do sono dos inocentes cúmplices.
Tudo muito estranho!
Um sono tranquilizante de uns e um pesadelo para milhões! Salta aos olhos de todo e qualquer cidadão que este conflito entre a Directora Geral da Autoridade Tributária e o Secretário de Estado só beneficiou e beneficia a EDP!
Tudo, mas tudo claro!
Mas há ainda outro grande problema…
A Autoridade Tributária terá dado «ordens» aos peritos independentes para avaliarem apenas os edifícios e os paredões das barragens, deixando de fora os centros electroprodutores.
Ou seja, reduziu tudo a dois terços do valor patrimonial total, com o consequente desprezo pela cobrança de muito imposto que poderia ter sido cobrado!
Mas há mais!
Além do IMI estão ainda por cobrar o Imposto de Selo, IMT e IRC relativos à tal venda das seis barragens do Douro pela EDP à francesa Engie.
De lembrar que o negócio milionário da venda destas seis barragens rendeu à EDP qualquer coisa como 2 200 milhões de euros!
Os 10 municípios da região dizem-se credores de cerca de 400 milhões de euros relativos a esses impostos que ainda não foram cobrados. A Câmara de Miranda do Douro já anunciou até que vai apresentar uma queixa-crime contra várias entidades públicas envolvidas no processo, designadamente as Finanças.
Mas a cereja no cimo do bolo chegaria em fim de legislatura! Ficou-se a saber que os funcionários das Finanças vão receber um prémio de 5 000 €/cada, por quê?
Se não cobram impostos a quem os deve pagar, por qual razão são premiados?
Fala-se de prémio de produtividade e curiosamente, ou talvez não, a portaria do “prémio” é assinada pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais!
Seja em que situação for, quando alguém é chamado a ocupar cargos públicos deve levar em linha de conta a assunção das responsabilidades, a transparência dos processos, o exercício de cidadania e de gestão ética e rigorosa da “coisa pública”, da salvaguarda dos interesses das pessoas, e a valorização das expetativas face ao futuro.
Comunicar e saber comunicar com quem nos elegeu, é um imperativo. É fundamental. Tão fundamental como um qualquer cidadão exercer em conformidade o seu direito cívico de procurar investigar, esclarecer e conhecer todos os fundamentos que determinaram as posições dos governantes.
Assim deve funcionar a democracia se é que ainda insistem em querer reclamá-la como tal!
Para o povo, tudo isto cheira a esturro e a negócios mafiosos. Se o tal secretário de estado fosse uma pessoa garantidamente de bem, ter-se-ia demitido e denunciado a situação quando não conseguiu fazer-se obedecer. O facto de não o ter feito diz muito e tudo acerca da tal democracia de que falamos.
Diz-me aquilo que não fazes quando devias, dir-te-ei em que porcaria de mundo é que tu vives!
(Crónica Jornal O Interior - 8 de Janeiro 2024)