quarta-feira, fevereiro 14, 2024

Ponto de vista

No dia 6 de Agosto de 2022 o Parque Natural da Serra da Estrela sofria o maior e mais devastador dos incêndios que há memória.

O sexto maior ocorrido em Portugal, desde que há registos.

O incêndio passou por dois distritos, Castelo Branco e Guarda, e seis concelhos, tendo consumido 24 mil hectares de terreno. Depois dos habituais e rotineiras acusações ao "incendiarismo" e às ignições eis que um relatório de peritos, convidados pelo Governo para fazer a avaliação dos grandes incêndios rurais de 2022, conclui que a manobra de um helicóptero fez perder o controlo do fogo que atingiu a Serra da Estrela.

Deixemos as análises técnicas dos peritos, e os relatórios dos mesmos e centremo-nos nas consequências gravosas que atingiram tão extensa área.

Sabemos e compreendemos que a ocorrência era de difícil gestão, não apenas pela humidade muito baixa que os combustíveis apresentavam, como pela orografia desfavorável típica de uma região montanhosa, a falta de acessos e pelo forte vento que se fazia sentir.

Felizmente que não se registaram vítimas mortais, mas as consequências de tal catástrofe foram enormes, nomeadamente para todo o ecossistema.

Lembrar que ecossistema é o nome dado a um conjunto de comunidades que vivem num determinado local e interagem entre si e com o meio ambiente, constituindo um sistema estável, equilibrado e autossuficiente. Logo, da definição apresentada resulta que quer o meio ambiente, quer as pessoas que com ele interagem sofreram a bem sofrer com o incêndio. As tais pessoas, cidadãos de um país em um ápice viram desaparecer pastagens, soutos, colmeias e tudo o mais de uma agricultura de parcos meios para se erguer. A pastorícia, a tão propagandeada pastorícia que faz o gáudio de tanto político em feiras e exposições sofreu a bem sofrer.

A Associação dos Baldios de Folgosinho, em Gouveia, avaliava em cerca de três milhões de euros os prejuízos do incêndio. Já a câmara da Covilhã falava em prejuízos de 35 milhões de euros só no concelho.

As ajudas, se de ajudas se pode falar, chegavam tardiamente e eram ínfimas para a grandeza do problema. Mas se não era a tardia resposta aos problemas, era a recorrente burocracia a travar as ajudas. Valores tabelados, e com facturas, as sementes, tão necessárias ao renovo, não eram elegíveis. Será que a casta politiqueira julga que os produtos agrícolas, são resultados de nascimento espontâneo? Muito sangue, suor e lágrimas, senhoras e senhores políticos! A resiliência destas gentes da serra tem limites. São fortes como o granito que cobre as paisagens, mas água mole em pedra dura…

Numa coisa estes políticos são inigualáveis. Para tudo marcam reuniões onde a retórica é sempre a mesma e os resultados nenhuns. Bem-falantes são eles! Oito meses após o grande incêndio surge o prometido “Relatório das lições aprendidas”.

Mas que título mais sugestivo, digno de uma redação da terceira classe de tempos idos. Promessas e mais promessas. Criar regionalmente equipas especializadas para dar melhor e mais apoio ao palco de operações e tornar mais eficiente o ataque inicial para combate apeado em zonas de reduzida acessibilidade e relevo acidentado era importante. Mas perguntamos com que meios humanos. Falamos de uma área com baixa densidade populacional. Não posso, não devo esquecer a acção dos bombeiros. Num país em que o despovoamento é enorme, principalmente na nossa região, ainda há bombeiros. Fecharam todos os serviços públicos, mas os bombeiros estoicamente resistem em defesa das populações e dos seus haveres. Já são poucos, mas dão a vida no socorro às populações. O nosso reconhecimento, pois são os que estão na linha da frente. Esta lembrança do incêndio da Serra da Estrela resulta do facto de o Conselho de Ministros ter aprovado no dia 8 de Fevereiro de 2024, quase ao fim de dois anos da tragédia, e estranhamente, ou talvez não, em época de campanha eleitoral, surgir o Programa de Revitalização do Parque Nacional da Serra da Estrela com uma dotação de 155 milhões de euros para «proteger o ecossistema da Serra da Estrela, dinamizar a economia regional e promover o desenvolvimento sustentável da região». Assim se lê no preâmbulo do programa. Percebe-se a intenção de só agora, surgir tal programa. É que o povo tem memória e não vá aparecer por aí alguém a chamar os políticos à pedra. A panóplia das medidas que o programa apresenta é tudo menos exequível nos tempos mais próximos. É uma lista de projectos recolhidos avulsamente e a granel para agradar aos politiqueiros da região e calar o povo. Ninguém de bom senso pode acreditar que tal rol seja algum dia executado. Se tudo isto não é palha, anda lá muito perto. Mas de palha gostamos é da de Abrantes, a outra, a que nos querem vender, não serve. Nem para alimentar o gado. Esta é a proposta de um governo que pela voz da ministra Mariana da Silva disse que queria deixar o Parque Natural da Serra da Estrela melhor do que estava? Isto não um programa, é um rol de intenções e senhora ministra, os portugueses estão fartos de intenções, queremos acção.

Tenham uma excelente semana.