Os Selos da Lituânia!
masturbo-me
vai para três ou quatro anos
e
estou só pele e osso.
na
minha cara abriram-se crateras
que
mais do que com a acne juvenil têm a ver
com
o meu propósito lunar,
rebelde
e deslumbrado,
por
não querer conter a natureza
e,
por ela, ultrapassar a última fronteira
de
uma libido pertinaz, sem mais remédio
que
ter que a exercer.
segundo
creio, não tarda e estou cego.
é
isso, pelo menos, o que prior avisa,
enquanto,
com certeza, estou cego é dos ouvidos
para
não ter que lhe ouvir a litania sonsa.
à
noite, indo para a cama, não vou
para
adormecer, mas para acordar
definitivamente,
fazendo do desejo
isto
que não sei porque me chama
mas
se institui como uma celebração,
ora
porque me morde e pica o sangue,
ora
porque um rio
ambrosiano
palpita entre os lençóis
em
que me encontro nu, enérgico e pronto
a
recomeçar a injunção premente
a
que chamo oblação, por ser palavra rara,
passível
de escutar-se nas aulas de moral,
a
que, quando estou distraído, estou atento.
não
sei se acabarei por me esgotar
nisto
em que ando, ou se estou louco
por
me terem marcado uma consulta
num
psiquiatra, amigo desta casa,
sob
o pretexto absurdo de que ando alheado
de
tudo à minha volta e leio em demasia poesia.
não
faço ideia do que dirá o médico,
que
presumo ser parecido com o freud,
de
bata branca e barba grisalha,
sempre
a tomar notas e a pôr questões em tudo
sobre
os sonhos que recorrentemente me acometem.
de
ciência certa sei que nada
me
apoquenta muito para além do que é normal
da
minha idade, que tenho sem porquês,
e
se injurio, como dizem, o corpo muitas vezes
é
porque sou inocente e o fascismo
pôs
os rapazes longe das meigas raparigas,
ou
por má consciência, ou o absurdo
de
impor aos costumes a premência
vital
de um sacrifício sem sentido.
ah,
eu mordo a almofada, eu faço
do
prazer o que me estremece a alma e amplia
o
fogo concreto de querer viver
sem
qualquer censura ao corpo,
profícuo
e viril, por mais cegueira que me atinja os olhos
por
hoje não voltar a ver algumas das vizinhas
na
correnteza intrépida
com
os mamilos espetados debaixo das blusas,
as
vulvas palpitantes sob as mini-saias,
as
línguas lânguidas de fora da boca
a
fazer-me caretas pela melancolia densa.
in
Os Selos da Lituânia, Lisboa, & Etc, 2008
©
do poema e da foto: Amadeu Baptista