1. Uma biblioteca de todos e para todos.
Escrevo este artigo, entre dois acontecimentos que marcam a vida cívica das gentes do concelho da Guarda.
Um, indiscutivelmente, é o novo espaço de funcionamento da Biblioteca Municipal da Guarda que, após anos e anos de falências de empreiteiros, derrapagens financeiras, milhões de euros desbaratados vê, finalmente, o dia da inauguração consumado.
Espera-se e deseja-se que o espaço seja funcional, dê resposta às várias solicitações de todos quantos queiram usufruir do equipamento na sua plenitude. Que o espaço seja lugar de motivação para a leitura e investigação; que possibilite uma interacção entre a cultura e o desejo de adquirir conhecimento, em tempo útil. Que a Biblioteca desempenhe cabalmente a sua função, num espaço, horário e liberdade de opções de leitura e reflexão, são os desejos de todos quantos acreditam que o progresso se faz na simbiose de uma cultura e aprendizagem de qualidade.
2. A dívida como futuro.
Outro momento é a reunião da Assembleia Municipal da Guarda, ainda o local democrático, da discussão e confronto de ideias, propostas na prossecução do objectivo de se encontrar solução para os graves problemas que o concelho, teimosamente, vai continuando a debater-se sem que o almejado progresso chegue.
Discute-se, assim se espera, o desenvolvimento do concelho, nas suas vertentes mais preocupantes: o económico, o social e o humano (como se algum deles deixasse, em momento algum, de estar interligado e conjugado com o tempo e o modo de saber fazer, saber ser e saber estar.)
O momento é de preocupação. A dívida da Câmara, segundo fontes geralmente bem informadas, já vai bem perto dos 50 milhões de euros. Sobe a parada agiota a cada momento de meditação (eleição).
Mas, pasme-se o leitor, para a veleidade com que se anuncia, que há falta de liquidez financeira na tesouraria. Vai daí, recorre-se a mais e mais agiotas. E, lá se «pedem» mais 2 milhões de euros.
Mas, dívidas arrastam dívidas, vai daí, toca a pedir mais e mais.
Logo de seguida pede-se um novo empréstimo; este já de maior monta, pois a montada é de respeito e dá votos, na ausência de planeamento e de rigor sobra a incompetência.
Agora grita-se: “temos que ter acesso aos fundos comunitários”.
São perto de 4 milhões de euros, a pagar em 15 anos, ou seja, quem vier a seguir que apague as luzes. A incompetência da governação camarária rivaliza com a do governo. Há-de fazer-se o povo pagar – a bem ou a mal!
Pois é!
É aqui na micro economia das políticas orçamentais da câmara, como o é na macro da política nacional. Os exemplos circulam em vasos comunicantes, como se de um fluído se tratasse. Aliás, e em bom rigor, os chefes (deles), nacionais, dão-lhes os péssimos exemplos; orçamentos e opções de plano para época eleitoral que ajudem a enganarem o Zé-Povinho. Mas que, em rigor são falácias, mentiras e desenganos para quem esperava outro desempenho governamental, seja qual for o patamar da responsabilidade.
3. A Câmara tem uma responsabilidade social e democrática.
Manifestamente, uma empresa e uma câmara municipal são diferentes desde logo na função social, económica e jurídica. Uma, a empresa, tem um ou vários accionistas que investiram para obterem lucro. Desde logo, os administradores terão de prestar contas a quem os incumbiu de tal tarefa, mas, só respondem perante tais investidores que, supostamente, têm toda a legitimidade de os mandar «passear», se os objectivos não forem alcançados salvo, se forem banqueiros, aí a «coisa» já muda de figurante, o governo, a «bem da nação», salvará os ditos esbanjadores.
Já numa câmara, os eleitos democraticamente, devem gerir BEM, os dinheiros, os móveis e imóveis que são, não de alguns, mas de TODOS os cidadãos.
Aqui reside, desde logo, a principal diferença!
Mas, se socialmente DEVERIA SER ASSIM, no âmbito jurídico os eleitos devem prestar as justificações que os eleitores achem necessárias, para que legitimamente se conheça a razão das escolhas e, principalmente, a motivação das mesmas.
Não perceber tais diferenças é, no mínimo, desconhecer as regras democráticas de informar e prestar contas aos cidadãos.
Ser eleito (cada vez mais raro!) para qualquer órgão ou instituição, não é servir-se de, mas sim SERVIR o povo que representa, tenha ou não votado nesse eleito.
Assim se entende a democracia; assim se responsabilizam eleitos e eleitores; assim se possibilita que os cidadãos participem, cada vez mais, na vida cívica do seu País.
Perceba-se isso, ou perderemos a oportunidade histórica de fazer da vida pública um direito de TODOS.
(Artigo publicado no jornal "O Interior" em 4 de Dezembro de 2008)