Ontem comemorou-se o dia do trabalhador. Os trabalhadores comemoram o seu dia com muita revolta e angústia face a um futuro incerto. O salário não chega para pagar sequer os bens de primeira necessidade. A fome alastra. As desigualdades entre ricos e pobres aumentam. O povo, essa palavra que tantos hipócritas gostam de encher a boca, é de novo esquecido, em que o apoio às famílias pobres é ridículo e mesmo ofensivo, em que o controlo dos preços da energia é uma ilusão. E a maioria dos media subestima e mesmo silencia o drama que já enfrentam a maioria das famílias portuguesas não merecendo a atenção dada a outras notícias. A vida mais difícil de milhões de portugueses é como não existisse levando o ministro das Finanças, com a insensibilidade e arrogância que o carateriza, e que carateriza também um governo de maioria absoluta, a declarar a um jornal que “deixei de ser ministro político e despesista em 15 dias”, como apoiar os mais vulneráveis fosse ser “despesista”. Segundo dados oficiais, do Instituto Nacional de Estatística, entre 2020 e 2021, a taxa de risco de pobreza ou exclusão social aumentou de 20% para 22%, ou seja, abrange já mais de 2 milhões de portugueses, e a taxa de privação material e social severa subiu de 5% para 6%, ou seja, mais de 600 mil portugueses não têm capacidade para ter acesso a bens essenciais. Esta situação é ainda mais dramática devido à escalada dos preços da alimentação que representa uma parte muito importante do orçamento das famílias portugueses de baixos rendimentos. A semana passada ficou-se a saber que foi em Portugal onde se verificou a maior subida na taxa de inflação de toda a Europa. Entre Março de 2021 e Março de 2022 os preços da alimentação subiram mais 36%, são dados oficiais. A escalada de preços que se está a verificar no país está a atingir a população portuguesa de uma forma desigual. Os mais pobres e os com rendimentos congelados são aqueles que estão a sofrer mais com a escalada de preços. E o governo, cego por ter a maioria absoluta na Assembleia da República e esperando que esta seja submissa, não compreende esta realidade dramática de milhões de portugueses. Lembrar que a mediana dos rendimentos em Portugal era, segundo o INE, apenas 792€ em 2020, isto significa que metade da população portuguesa tinha um rendimento mensal inferior a este valor. Escusa um primeiro-ministro de vir deitar areia para os olhos dos portugueses ao dizer que, e passo a citar : «considera “intoleráveis” os níveis de pobreza laboral que se registam em Portugal e apontou o combate à precariedade e à intermitência laboral como “absolutamente essencial”». Mais uma vez falta à verdade e ilude os portugueses. Há quantos anos é primeiro ministro? O que fez para que todo este escândalo de pobreza laboral terminasse. Ainda por cima em época de vacas gordas e sagradas a ajudarem? Nada fez e os resultados aí estão. Aumentar o salário mínimo é só uma gotícula a cair na garganta sequiosa dos que atravessam o deserto da miséria. Anunciar, com pompa e circunstância, como o governo de Costa fez uma medida para apoiar as classes mais vulneráveis face à escalada de preços é ridícula e mesmo ofensiva. Ela consta dos art.º 4º, 5º e 6º do Decreto-Lei n.º 28-A/2022 que diz o seguinte: “É criado o apoio extraordinário às famílias mais vulneráveis ao aumento dos preços de bens alimentares. “São abrangidos pelo apoio referido no artigo anterior as famílias beneficiárias da tarifa social de eletricidade por referência ao mês de março de 2022”. E “o valor do apoio extraordinário é de 60€ por agregado familiar e é pago pela segurança social, apenas no mês de abril de 2022”, portanto é pago uma única vez. Isto é um assistencialismo miserabilista. Para este governo, após Abril os preços baixam, e os pobres já não precisam do apoio do Estado, embora o próprio FMI já tenha alertado para o facto de que “a inflação pode ser persistente” dando assim indicações aos Bancos Centrais que se devem preparar para aumentar as taxas de juro o que seria dramático para as famílias, profundamente endividadas com o crédito à habitação e ao consumo, e também para o Estado que está também muito endividado. De acordo com este decreto, o apoio extraordinário único de 60€ seria apenas pago aos beneficiários da tarifa social de eletricidade que são apenas uns 700 mil, sendo excluídos até os beneficiários da tarifa social de gás que são uns 49 mil. Os “felizardos” que receberão os 60€ só uma vez representam apenas 40% dos mais de 1milhão de pobres que já existiam no nosso país em 2020. Face a tanta crítica o governo decidiu introduzir no Decreto-Lei n.º 30-D/2022 uma norma (art.º 5º) que diz o seguinte: “São também abrangidos pelo apoio extraordinário de 60€ os beneficiários: (a) do complemento solidário para idosos; (b) do rendimento social de inserção; (c) da pensão social de invalidez do regime especial de proteção na invalidez; (d) Do complemento da prestação social para a inclusão; (e) Da pensão social de velhice; f) do subsídio social de desemprego”. Mesmo com esta extensão o número de abrangidos continua a ser muito reduzido – mudou-se alguma coisa para tudo ficar na mesma – pois como o governo inscreveu no orçamento apenas 55 milhões € para apoiar “as famílias mais carenciadas” aquele valor dá para pagar apenas 916.667 apoios extraordinários. E se for às famílias isso significa que cada membro da família receberá uma esmola de 20€ e só num mês. É ridículo e chocante a forma com este governo trata os mais pobres no nosso país. Tenham respeito pelos que arduamente labutam para vegetarem. Todos os que têm salários de miséria, os precários e os pensionistas. Todos os apoios que o governo anuncia são um paliativo para uma doença grave que necessita de tratamento bem mais actuante. Já sabemos que o lema do governo é «não hostilizar as empresas». Já o sabemos! Por isso é que deram uma ajuda substancial à empresas para compensar o aumento do salário mínimo. Mas as ditas ajudas serviram para distribuir milhões pelos administradores. Para uns, os mais pobres, ajudas miseráveis. Para os ricos benesses. E que dizer de outras medidas que constam dos mesmos dois decretos-leis que se destinam a conter a escalada dos preços da energia (combustíveis, gás e eletricidade). Para elas o governo inscreveu no Orçamento do Estado não 55 milhões €, mas sim 518 milhões euros (pág. 62 do Relatório), ou seja, 9,4 vezes mais. E visam financiar as empresas do setor de transportes e os transportes das entidades do setor social e solidário. Mas como o governo se recusa a fazer qualquer controlo dos preços, ou das margens de comercialização ou de refinação, as empresas de energia continuarão com a liberdade total para fixar os preços que queiram, e o financiamento do Estado servirá para garantir os preços e os lucros especulativos destas empresas de energia utilizando a justificação da guerra e da insegurança que ela cria nos mercados, à custa não só dos consumidores, mas também do próprio Estado. Percebemos, «as empresas não podem ser hostilizadas», como diz o outro. E que dizer da habitação? Dados oficiais dizem que há mais de 8 mil cidadãos sem-abrigo. Aumentam os sem-abrigo. Isto depois de uma promessa de Marcelo para acabar com os sem-abrigo. Condições mínimas para uma habitação condigna? Uma ilusão, um embuste. Só os ricos as conseguem. Mas a crise não é para todos. Os cinco maiores bancos portugueses pagaram mais de 25 milhões de euros aos seus administradores. Comemorar o quê no dia mundial do trabalhador? Nada. Aos trabalhadores só lhes resta a luta, nada mais.
Tenham uma boa semana.