É
com enorme preocupação que os europeus deveriam encarar a forma como está a ser
abordada a crise dos refugiados. Deveriam ter consciência de que o acordo
recentemente assinado pela UE com a Turquia é mais um daqueles erros colossais que
nos conduziram à triste situação atual. De facto, os 28 chefes de estado e de
governo submeteram-se a praticamente todas as exigências de Ancara, assinando um
acordo ilegal à luz do Direito Internacional e envolvendo-se um pouco mais num
pacto com o diabo.
Entregar
3 mil milhões de euros, de mão beijada, sem capacidade de escrutínio, a um
regime corrupto e despótico como o de Ancara, não vai resolver problema nenhum.
O regime turco apoia direta ou indiretamente os jiadistas na Síria. Essa é que
é a verdade que o Ocidente insiste em ignorar. O presidente Erdoğan da Turquia
até apoiaria o próprio diabo, desde que este combatesse os curdos, inimigo
secular dos turcos, o que na verdade sucede. A 1.ª prioridade dos turcos é
sufocar a revolta curda. A 2.ª, também. E por aí fora, até à 20.ª prioridade.
Só depois vêm outras, e mesmo assim passarão sempre pelo problema curdo.
O
regime turco violará todos os acordos internacionais, violará os mais básicos
direitos humanos, violará tudo aquilo que houver para violar, sempre em nome
desse combate fundamental ao inimigo e da sua manutenção do poder. Dar-lhe
dinheiro terá o mesmo efeito que as patéticas tentativas, antes da 2.ª guerra
mundial, de aplacar e controlar Hitler, e é dessa forma que a atitude da UE será
recordada pela História. Muito desse dinheiro acabará na Síria, ajudando os
inimigos do Ocidente – que não são decerto os curdos – e provocando ainda mais
refugiados.
O recente confronto entre o presidente da UE,
Donald Tusk, um polaco que defende os interesses da Alemanha, e o presidente da
Comissão, Jean-Claude Juncker, um luxemburguês que defende os interesses dos
E.U.A., é a prova do desnorte a que a Europa chegou. Para enorme satisfação de
um primeiro-ministro Turco, tranquilamente irónico, que a propósito desta
situação, afirmou: «A democracia é como um tramway, subimos para ir aonde
queremos e aí chegados descemos»!
Erdoğan
não é um político como os europeus. Reivindica-se de uma ideologia supremacista
étnica, comparável ao arianismo nazi. Governa a Turquia pela força. Ganhou as
eleições de forma fraudulenta e controla hoje uma imprensa quase sempre
amordaçada. Recebeu da Arábia Saudita 2 mil milhões de euros para apoio à sua reeleição.
A mesma Arábia Saudita que, na sua luta contra o Irão, aliado do regime sírio,
apoia o Daesh. Dezenas de candidatos da oposição foram presos e colocados em
prisão preventiva durante a campanha. Centenas de opositores foram mortos
durante a campanha eleitoral. Desde a sua «eleição», uma cortina de chumbo
desceu sobre o país. Tornou-se impossível alguém poder informar-se sobre o
estado da Turquia através da sua imprensa nacional. A guerra civil, que lavra
já no leste do país, estende-se, com atentados em Ancara e Istambul, perante a
total indiferença dos europeus. Erdoğan governa quase só, rodeado por um grupo
restrito, e anunciou a intenção de alargar a definição legal de «terroristas»
para incluir todos os que são «inimigos dos Turcos», quer dizer os Turcos e
não-Turcos que se opõem ao seu supremacismo. Está ainda envolvido, através dos
laços pessoais do seu filho Bilal com Yasin al-Qadi, o banqueiro global da
Al-Qaida, com outros inimigos do Ocidente.
Ao
comprometer-se a colocar um fim aos vistos exigidos aos turcos para entrarem na
Europa, a UE troca os refugiados, que na sua maioria são anti-Daesh e
anti-Al-Quaida, pelos turcos, muitos deles já radicalizados e muito mais
perigosos. O cavalo de Troia, ao contrário do que muita propaganda por aí afirma,
não é sírio, afegão ou iraquiano. É turco!
Alguém
disse um dia que a História é a ciência que estuda a infelicidade dos homens,
uma elogiosa compilação de todo o mal que o homem fez sobre a terra. No caso
presente, eu acrescentaria que se torna cada vez mais numa corrida entre a
lucidez e a catástrofe.
Tenham um muito bom dia!