Alguém
disse um dia que a farsa sorri para fora e chora por dentro. Talvez por isso,
poucos terão sido os guardenses que se aperceberam da farsa que – mais uma vez
– se consumou a semana passada à custa do nosso hospital. A história, como
tantas outras que são a imagem de marca da nossa política local, faz rir e
chorar ao mesmo tempo.
Há
pouco mais de duas semanas a Inspeção das Atividades em Saúde – IGAS – deu à
estampa um relatório devastador para a atual administração da ULSG. Em bom
rigor o relatório dirigia-se à administração anterior, de Vasco Lino, o tal
gestor da Covilhã que cometeu crimes de abuso de confiança fiscal e que foi convenientemente
substituído por Carlos Rodrigues, o homem de mão de Álvaro Amaro. Mas a vergasta
assenta que nem uma luva aos atuais gestores, não só porque são praticamente os
mesmos do tempo de Vasco Lino, como, ainda por cima, o único que veio depois
também não mexeu uma palha que fosse para mudar aquilo que estava mal.
Expressões
dirigidas pela IGAS aos gestores da ULSG a propósito da dramática situação no
serviço de cirurgia, tais como “a administração não seguiu as normas legais”, “originou
mal-estar, nada abonando à imagem da ULSG”, “gestão descuidada”, “a situação
verificada pode colocar em causa os princípios da legalidade, da igualdade de
tratamento, da imparcialidade e da transparência”, “poderá perpetuar e agravar
o risco da perda de qualidade dos serviços prestados”, ou outros miminhos do
género, expõem de forma cruel a absoluta incompetência dos membros da atual administração
da ULSG para lidar com dossiers que exijam dotes mínimos de ponderação e bom
senso.
A
IGAS chega ao ponto de propor, devido ao desastroso desempenho da
administração, a possibilidade de “responsabilidade financeira sancionatória da
competência do Tribunal de Contas”! Nunca, em anos e anos de conflitos e de problemas
no nosso hospital, vi uma administração ser destratada de forma tão violenta e humilhante
como aquela que – espera-se que já por pouco tempo – ainda conduz os destinos
do nosso hospital.
E
o que fez o governo? Permitiu que um secretário de estado viesse à Guarda para
participar numa cerimónia de charme! Foram ingenuamente elogiados uns
protocolos de fachada para trazer médicos de Coimbra, nomeadamente
ortopedistas, sem os quais a escala de urgência teria mais buracos do que um
queijo suíço! Nada que não aconteça há anos com pelo menos mais meia dúzia de outras
especialidades, de forma totalmente informal devido aos contactos que os
médicos de vários hospitais vão naturalmente cultivando entre si! E sem o
chinfrim mediático com que agora se tentou fazer esquecer a vergonha infligida
aos homens de confiança do nosso presidente da Câmara.
Percebo
que uma administração incompetente se agarre ao primeiro barrote que passa só
para permanecer à tona. Já me custa mais aceitar que seja um membro da própria tutela
a desrespeitar as lapidares considerações técnicas de uma inspeção do Estado.
Para
cúmulo do despudor, nenhum dos vários ortopedistas do serviço aceitou
comparecer à encenação apadrinhada pelo tal secretário de estado, o que não
deixa, no mínimo, de nos suscitar um aplauso! É que o ridículo, quando é muito,
dói até aos ossos. E nada melhor do que um ortopedista para literalmente dar
conta disso…
A
ULSG transformou-se numa espécie de recurso enquanto agência para empregar os
boys do partido de Álvaro Amaro. É do conhecimento público a explosão de
litigância à volta de concursos feitos à medida para o preenchimento de vagas a
gosto, antes que a maré mude. Nada a que não estejamos, também, habituados em
sentido inverso.
Ao
mesmo tempo somam-se as queixas em Tribunal devido à má qualidade do serviço
prestado aos utentes. Não será por acaso. É que no universo verdadeiramente
esquizofrénico em que mergulhou a politiqueirice local, vale tudo. Até querer tapar
o sol com a peneira. E se for um secretário de estado a segurar nela, ainda melhor.
(Crónica no jornal O Interior - 9 de Fevereiro de 2016)