Chegados
ao fim de mais um ano civil, é altura de balanços.
Em
termos sociais, devemos pensar no desenvolvimento do nosso país e naquilo que
se ganhou e perdeu. Estamos hoje melhor ou pior do que há uma ano? A resposta a
esta pergunta determinará o nosso futuro imediato.
Recordam-se
do relógio colocado, estrategicamente, numa rotunda da estação, onde se marcava
o tempo para o fim da chamada PLIE? Passado algum tempo o relógio colapsou,
assim como colapsaram as verbas para todas as obras anunciadas. E colapsaram os
sonhos. É exatamente de coisas destas que eu falo, do risco de confundirmos a
esperança ou os desejos com a realidade. Do risco de afinal nos tomarem por
parvos.
Não
basta por isso repetir até à exaustão que 2014 será o ano em que nos vamos ver
livres da «troika». Nem pensem! É que a «troika» vai, mas as políticas ficam.
Mesmo a milhas, vamos sentir-lhes o bafo no pescoço.
Ainda
que seja verdade - e não sei se é - que a economia portuguesa iniciou um ciclo
de ténue recuperação, a situação é um pouco como a de um doente em fase
terminal que conseguiu finalmente mexer um dedo.
Neste
contexto o discurso de Natal do primeiro-ministro equivale ao daquele médico
que quisesse convencer-nos de que o doente em causa conseguirá andar sozinho,
assim que se desligar, lá para os vindos de junho, a máquina que o liga à vida.
É verdade que não prometeu que o doente saltará e correrá. Mas essa é a única
verdade no discurso de Passos Coelho.
Não
vale a pena determo-nos no conjunto de lugares comum que normalmente enfeitam
este tipo de discursos, seja acerca do n.º de postos de trabalho criados, da
abrangência do subsídio de desemprego, ou de outra coisa qualquer.
O
problema é de fundo. Mesmo que a nossa economia recupere, isso vai acontecer a
um ritmo muito inferior ao do aumento dos problemas que nos afligem. É uma
situação de clássica corrida contra o tempo, que o ano de 2013 demonstrou
estarmos a perder. E é isso que importa.
O
PIB pode crescer, mas a dívida pública vai crescer ainda mais. Essa dívida
somava em outubro de 2013 mais de 209 mil milhões de euros. Representava então
124% do PIB. Gera um volume absoluto de juros que não cessa de aumentar,
esmagando qualquer eventual benefício de uma improvável descida sustentada das
respetivas taxas.
O
envio do Orçamento de
Estado para o Tribunal Constitucional, para fiscalização preventiva, por parte
do presidente da República, teria pelo menos equivalido a um banho de realidade.
Ao não ter acontecido, representa um salvo-conduto para a manutenção da ilusão
de que estamos a ir pelo bom caminho. Sem possibilidade de toque a rebate.
O que é
trágico, em tudo isto, é podermos constatar como em 2013 não ficámos melhores
do que no ano anterior. Isso sim, deveria ser a medida de todas as coisas. Em
2014 não ficaremos melhor do que em 2015. E por aí fora, até o desespero
provocar um daqueles eventos sociológicos e políticos que marcam e redefinem a
história, quer gostemos, quer não.
Em momentos
destes, em que o desalento me assalta e a realidade entra pelos olhos adentro,
já nem consigo perceber o que verdadeiramente faz correr esta gente que nos
governa. É que matar a galinha dos ovos de ouro, nem para eles é bom. Acho eu.
Mas, como
dizia Miguel Torga, "Em Portugal, as pessoas são imbecis ou por vocação,
ou por coacção, ou por devoção". É só escolher.
Tenham um bom
ano, dentro do que é possível, com saúde e a liberdade que ainda forem conseguindo
conservar.
(Crónica na Rádio F - 30 de Dezembro 2013)