Iniciamos
esta crónica com duas felicitações.
Uma
devida aos 813 anos da Guarda.
Guarda
não apenas relativa à cidade mas extensível a todo o concelho. Esta coisa de se
dizer Guarda não pode nem deve ser redutora. Abrangente quanto baste. Todos os
que nasceram ou adotaram como sua, esta terra, que por cá vivem ou trabalhem,
quer na cidade ou numa aldeia por mais pequena que seja. A todos os que
diariamente querem fazer desta terra a sua terra de trabalho. Algo que
infelizmente vai sendo uma miragem. Aos que acreditam e vão resistindo são a
prova de como dizia o mestre Aquilino Ribeiro, um verdadeiro beirão tem feitio
positivo, tenacidade e constância. E, a todos os que por razões óbvias
partiram, a todos sem exceção, os nossos parabéns pelos 813 anos.
Esses
mesmos valores que falava mestre Aquilino determinam os cinquenta anos de uma
instituição: o Centro Cultural da Guarda. A todos quantos trabalham e dirigem
aquela instituição vão os meus parabéns pelo aniversário. Nunca esquecendo o
contributo que o Centro Cultural da Guarda deu, ao longo destes anos, na
aprendizagem nos vários domínios da cultura a muitos e muitos cidadãos e,
também, pela divulgação da nossa terra além-fronteiras. Parabéns.
Esta
semana não há como fugir ao assunto do momento aqui pelas terras da Guarda: a
demissão de Ana Manso e a sua substituição por uma nova equipa na gestão da
Unidade Local de Saúde.
No
entanto, essa questão não se resume à saída de uma equipa e à entrada de outra.
Tem inúmeros contornos, relacionados entre si e que vale a pena tentar
enumerar.
Em
primeiro lugar, e salvo melhor ou mais fundamentada opinião, a saída de Ana
Manso da direcção da ULS menos de um ano depois de ter sido nomeada fica a
dever-se fundamentalmente a si própria e não a qualquer cabala política.
Não é
novidade para ninguém que a escolha de Ana Manso para dirigir os destinos da
ULS da Guarda se rodeou de contornos bizarros e obscuros. Vimos agora
confirmados pela boca de Júlio Sarmento os rumores que ecoavam desde o 1.º
minuto segundo os quais Ana Manso tinha sido nomeada não pelo ministro da
saúde, não por indicação do presidente da ARS Centro, não por influência das
estruturas do PSD local, mas sim pela mão omnipresente do ministro Relvas.
(Fazendo
um parêntesis, quase me apetece perguntar porque razão neste Portugal da 2.ª
década do século XXI não há assunto em que não apareça o nome deste Relvas. O
homem está em todas.)
Ou
seja, Ana Manso, que não foi propriamente um agente passivo nessa escolha –
bateu-se forte e feio pelo lugar - pôs-se a jeito desde o 1.º momento ao
ambicionar e aceitar o desempenho de um cargo tendo como suporte político e hierárquico
apenas e só o ministro Relvas. Erro crasso como agora somos levados a
constatar.
Fragilizada
à partida desta forma, Ana Manso, muito ao seu estilo, decidiu desafiar o
destino: mandou vir o marido de Castelo Branco, tentou nomeá-lo auditor interno
provocando a gargalhada do país inteiro, iniciou um processo de perseguição ao
único elemento do conselho de administração que não tinha a sua confiança, meteu
naquela casa amigos fiéis sem contrato, cometeu erros atrás de erros que viriam
a ser identificados pela Inspecção-Geral da Saúde, varreu do mapa da ULS uma
série de funcionários que se tornaram de imediato seus inimigos, ignorou o
diálogo com as estruturas locais do seu próprio partido, não resolveu o
problema das obras do novo hospital, deixou-se envolver em episódios
rocambolescos como o dos cadáveres que pernoitam com os vivos ou saem pela
porta do cavalo, hostilizou o presidente da ARS Centro e para culminar foi
incapaz de solucionar o problema das direcções de alguns serviços clínicos,
como o de Cirurgia, com consequências possivelmente catastróficas para a
idoneidade formativa de novos especialistas.
Não é
coisa pouca.
No
entanto, todo este processo deve fazer pensar em algo de muito mais importante
e estrutural: o método de nomeação dos gestores públicos em Portugal.
É
chocante que em pleno Portugal do século XXI os lugares de gestão na
administração pública continuem a constituir um imenso alfobre de tachos
avidamente disputados por militantes dos partidos do poder.
Mais
chocante ainda é assistir a este triste espectáculo com actos que incluem um
ministro Relvas a meter a colher na área do seu colega da saúde, um líder de
uma estrutura partidária (Júlio Sarmento) a assumidamente tentar influenciar
decisões que dizem respeito a instituições públicas, como é a ULS da Guarda, um
lavar de roupa suja em público entre gestores públicos (pagos com dinheiro do
Estado, ou seja, de todos nós) e dirigentes partidários, a notícias de jornal e
televisão que colocam a Guarda na ribalta pelas piores razões e finalmente a
uma solução inspirada no mesmos métodos.
O
novo conselho de administração da ULS da Guarda vai ser constituído por 5
elementos: 3 deles pouco ou nada conhecem da realidade da vida hospitalar e,
tanto quanto se sabe, são pessoas que não se conhecem entre si (com excepção,
talvez, do enfermeiro-director e da directora clínica hospitalar).
São
pessoas que não conhecem o pensamento umas das outras, não conhecem as
respectivas experiências profissionais prévias mas que vão ter que se articular
no sentido da tomada de decisões vitais para o presente e para o futuro da
instituição.
No
entanto, terão todas algo em comum: a confiança política de quem as escolheu e,
em última análise, a bênção do ministro Relvas.
Não
quero nem vou agoirar, mas enquanto guardense desejo ver resolvidos rapidamente
problemas como o do novo hospital, o da garantia da manutenção da maternidade,
da manutenção da idoneidade formativa do serviço de Cirurgia, da renovação de
um quadro médico envelhecido e das querelas e conflitos que muitas carreiras
têm destruído naquela casa.
Mas
primeiro temos que esperar que os 5 novos elementos do conselho de
administração se apresentem uns aos outros, decorem os respectivos nomes e
tenham a sorte de convergir nos projectos que levam na cabeça.
Sobretudo
o que estas pessoas precisam é de que o ministro Relvas não acorde um dia
virado para o lado contrário e decida demiti-los.
Já
agora, um aviso à navegação, constou-me que Ana Manso vai andar por ali.
Crónica na rádio F, segunda-feira dia 26 de novembro de 2012.