quinta-feira, junho 13, 2024

Crónica Jornal O Interior

 Promessas, ilusões, quimeras e mentiras

Aquando dos períodos eleitorais a grande maioria dos partidos faz aquilo que o povo designa por ter mais olhos que barriga, ou seja, a tudo e a todos se promete. São os aumentos salariais, é a melhoria considerável das condições de vida e um dia chegar-se-á ao ponto de prometerem a cada cidadão um carro topo de gama à porta da vivenda. São as quimeras de uns quantos anafados que, bem na vida, fazem sonhar os incautos. Vem tudo a propósito de aumentos e outras promessas que uns quantos fizeram crer ao povo português que tudo era possível com o anúncio do “milagre Medina”. Agora, aquando das rondas negociais para aquilatar dos anseios dos trabalhadores e das vontades do Governo, eis que os impasses se sucedem e a expectativas são goradas. Pelo menos pelo que é dado a conhecer até ao momento. Uns, os que agora detêm o poder, dizem que o tal “milagre de Medina” não vai permitir atingir tantos beneficiários. Outros, nomeadamente o visado Medina, vem dizer que há ou ignorância, ou falsidade nas afirmações proferidas. Acusando o actual Ministro das Finanças, Miranda Sarmento, de não saber distinguir Conta Pública de Conta Nacional face ao déficit ocorrido no 1.º trimestre de 2024. Recuemos um pouco no tempo e encontraremos facilmente as razões para tal deslumbramento celestial. Tudo começou com o cenário idílico criado por Medina. Só que o sonho de Medina tornou-se pesadelo. Quando Fernando Medina, ainda como Ministro das Finanças, anunciou que a execução orçamental prevista para 2023 se traduziria num excedente superior ao anterior, o que poderia justificar a constituição de um “Fundo Soberano” logo crismado como “Fundo Medina”, e, posteriormente, que, os resultados de 2023 permitiam reduzir a dívida pública a menos de 100% do PIB, os deuses do Olimpo sorriram. Logo soaram as trombetas de alarme. Dizia-se que Medina financiava a queda da dívida pública com dinheiro das pensões futuras, através do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, dos quais foram investidos mais de 7,7 mil milhões de euros na aquisição de títulos de dívida da República, nomeadamente de obrigações do Tesouro. Lembrar que a notícia teve origem num estudo da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), junto da Assembleia da República, identificado como Relatório UTAO nº 4 / 2024, datado de 9 de Abril de 2024, com assunto “Relatório UTAO n.º 4/2024 Condições dos mercados, dívida pública e dívida externa: março de 2024” e publicado na página da Assembleia com o mesmo título: Explica o relatório que houve orientações para se fazer a aplicação em Certificados Especiais de Dívida de Curto Prazo, que a Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública deverá remunerar. A UTAO – gerando uma reacção de desagrado de Medina – considerou “artificial” a redução do peso da dívida pública abaixo dos 100% do PIB, enquanto não resultado de amortização da dívida, mas apenas de um efeito de consolidação contabilística, sendo, contudo, certo que é o conjunto da dívida consolidada das administrações públicas o relevante para efeitos do Tratado de Maastricht. A UTAO referiu também que de 2023 para 2024, a “dívida comercial” (a fornecedores) aumentou 306 milhões de euros. Por dificuldades de cômputo da dívida comercial, quando o Tratado foi aprovado, tal dívida não foi considerada relevante para efeitos do Tratado. Terá sido Medina tão maquiavélico que quis que os serviços aplicassem disponibilidades de tesouraria na compra de dívida pública em vez de pagar aos fornecedores? Esse, sim, seria um truque que não poderia ser perdoado a Medina e tão ou mais grave que ignorância.


(Crónica Jornal O Interior - 6 de Maio 2024)