domingo, maio 21, 2023

Ponto de vista

O linguista, filósofo e activista Noam Chomsky definiu dez estratégias para a manipulação da opinião pública.
Não vamos, como é óbvio desenvolver todas as estratégias enunciadas pelo professor emérito do MIT, o Massachusetts Institute of Technology, mas fica o desafio para todos os que assim o desejarem pesquisar, analisar e confrontarem as estratégias enunciadas pelo professor com as vivências que nos vão sendo impostas e perceber como somos manietados e conduzidos como cegos para a caverna de Platão.
Vem tudo a propósito da criação de mais uma Comissão de Inquérito Parlamentar que está direccionada, supostamente, à gestão da TAP. 
Mas para que servem as ditas comissões? As Comissões Parlamentares de Inquérito são pedidas recorrentemente pelos partidos, com assento na Assembleia da República para obterem esclarecimentos sobre polémicas, sejam elas dentro ou fora do Governo.
Já foram muitos os políticos, administradores de instituições financeiras ou entidades públicas e até diretores desportivos que se sentaram nas salas da Assembleia da República e responderam aos representantes parlamentares.
Como primeiro passo para o bom funcionamento de uma comissão de inquérito parlamentar, importava que por parte dos partidos houvesse uma vontade genuína de cumprir objetivos e abandonassem o vedetismo.
Uma Comissão Parlamentar de Inquérito existe para saber se há ilegalidades, abusos de poder, fraudes e favorecimentos.
O caso em análise, a Comissão de Inquérito Parlamentar à TAP pretende averiguar as decisões de gestão e o exercício da tutela política que possam ter lesado os interesses da companhia e, logo, o interesse público. Ou seja, avaliar a administração da TAP, mas também Pedro Nuno Santos, João Leão e Fernando Medina e, no limite, a ação dos Governos de Costa na transportadora aérea.
Era só isto que devia estar a ser discutido e, principalmente, o apuramento das responsabilidades na gestão da transportadora aérea. Tudo o que gravita, e é muito, à volta do caso TAP são manobras de distracção bem definidas por Noam Chomsky. Desde quando o hipotético furto ou roubo de um computador, as célebres cenas de suposto arrombamento de uma janela do ministério das infraestruturas por uma bicicleta eléctrica, o encerramento numa casa de banho de funcionárias do ministério ou os arrufos encenados entre um Presidente da República e o Primeiro-Ministro têm alguma coisa a ver com a péssima gestão da TAP?
Marcelo sabia que o pedido de demissão de um ministro a Costa era uma encenação teatral que não teria consequências.
Os acontecimentos que se seguiram vieram a provar que só houve distrações para desviar a atenção dos portugueses do que realmente é importante e que se estava a passar na Assembleia da República, nomeadamente com a audição à ex CEO da TAP, onde a gestora francesa reduziu a cinzas a acção de ministros, representantes parlamentares e outros que tais. Uma verdadeira vergonha de todo o tamanho da qualidade da elite governativa.
Era importante que o povo português distinguisse, com exactidão, o que são manobras de distracção e se foque no essencial da investigação às causas e consequências da má gestão da TAP.
Mas será que isso importa a governantes, representantes e, principalmente, a certa comunicação social que faz dos acontecimentos acessórios o importante da investigação? Bem se sabe que a venda de jornais, as audiências televisivas vivem e alimentam-se do ribombar dos foguetes.
Centremo-nos nas diferentes formas de controlo das empresas públicas por parte do poder executivo, da forma como certos negócios foram conseguidos em benefício dos intervenientes e em prejuízo dos contribuintes, como favores de todo o feitio foram conseguidos, como se arrasou uma empresa com destruição de postos de trabalho, trafulhices e negociatas dignos de uma quadrilha, como se fazem elogios gratuitos a personagens e a acções.
Lembrar aos mais incautos que uma Comissão Parlamentar de Inquérito é, segundo o artigo 1.º do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares um mecanismo democrático que tem como função “vigiar o cumprimento da Constituição e das leis” e “apreciar os atos do Governo e da Administração”.
Todo o cidadão, devidamente informado, sabe que as comissões parlamentares servem para escrutinar e não para aplicar a justiça. Esse processo cabe a entidades exteriores como a Procuradoria Geral da República ou o Ministério Público. Mas quantas das conclusões das comissões seguiram para aquelas entidades?
As Comissões Parlamentares de Inquérito são mais um elemento fundamental para o desempenho da função essencial do Parlamento que é o escrutínio do governo e das instâncias da administração pública, numa democracia representativa.
Tudo o que se disser e fizer para criar nuvens de fumo em torno de tal escrutínio é passar um atestado de imbecilidade aos portugueses. Sejam sérios e honestos. Contas certas como se ouve com insistência também significa clareza e ética nas atitudes. É isso mesmo que se pede a todos os políticos, seriedade e total transparência. Ora o que se passou na Comissão de Inquérito à gestão da TAP, demissão do presidente da Comissão, algo raro, sem explicações sérias e plausíveis leva a supor que algo de muito grave está a ser escondido aos portugueses. Mas já estamos habituados às meias verdades.
Tenham uma boa semana.

(Crónica Rádio F - 15 de Maio 2023)