Em carta que envia a Chardon, seu editor, Eça explica a obra:[...] ”É a biografia de um indivíduo imaginário, escrita por um sujeito imaginário. O Conde de Abranhos é um estadista, orador, ministro, Presidente do Conselho, etc., etc., que, sob esta aparência grandiosa, é um patife, um pedante e um burro.” [...]
Excerto de um relatório que acompanha o Projecto de Reforma do Ensino de Alípio Abranhos:
“O estudante, habituando-se, durante cinco anos, a decorar todas as noites, palavra por palavra, parágrafos que há quarenta anos permanecem imutáveis, sem os criticar, sem os comentar, ganha o hábito salutar de aceitar sem discussão e com obediência as ideias preconcebidas, os princípios adoptados, os dogmas provados, as instituições reconhecidas.
Perde a funesta tendência – que tanto mal produz – de querer indagar a razão das coisas, examinar a verdade dos factos; perde, enfim, o hábito deplorável de exercer o livre exame, que não serve senão para ir fazer um processo científico a venerandas instituições, que são a base da sociedade.
O livre exame é o princípio da revolução.
A ordem o que é? A aceitação das ideias adoptadas.
Se se acostuma a mocidade a não receber nenhuma ideia dos seus mestres sem verificar se é exacta, corre-se o perigo de a ver, mais tarde, não aceitar nenhuma instituição do seu país sem se certificar se é justa.
Teríamos então o espírito da revolução, que termina pelas catástrofes sociais!”
O Conde de Abranhos, Eça de Queiroz, (1879).
Qualquer semelhança com a presente realidade, é mesmo triste coincidência, quase 200 anos depois.