domingo, janeiro 26, 2014

Com destinatário certo

«A Acção Mais Degradada

A acção mais degradada é a daquele que não age e passa procuração a outrem para agir - a dos frequentadores dos espectáculos de luta e a dos consumidores da literatura de violência. Ser herói e através de outrem, ser corajoso em imaginação, é o limite extremo da acção gratuita, do orgulho ou da vaidade que não ousa. Corre-se o risco sem se correr, experi­menta-se como se se experimentasse, colhe-se o prazer do triunfo sem nada arriscar. E é por isso que os filmes de guerra, do heroísmo policial, de espionagem, têm de acabar bem. Porque o que aí se procura é justamente o sabor do triunfo e não apenas do risco. O gosto do risco procura-o o herói real, o jogador que pode perder. Mas o espectador da sua luta, degradado na sedução da acção, acentua a sua mediocridade no não poder aceitar a derrota, no fingir que corre o risco mesmo em ficção, mas com a certeza prévia de que o risco é vencido. O que ele procura é a pequena lisonja à sua vaidade pequena, a figuração da coragem para a sua cobardia, e só a vitória do herói a quem passou procuração o pode lisonjear.

E se o herói morre em grandeza, há o prazer ainda de o espectador estar vivo para saborear a coragem do que morreu e a não pode já saborear. A vida do herói estende-se assim para além da sua morte onde a espera o espectador para se investir da glória que lhe coube e ele já não pôde gozar. É de dentro da vida e do conforto que o espectador da coragem saboreia o prazer da coragem que não tem. Daí às vezes a ilusão de que também ele poderia enfrentar os mesmos riscos, se os enfrentasse. O que lhe fica à superfície de toda a acção é o gosto dessa acção e não a dificuldade de a realizar. Daí que na realidade ele pudesse talvez atirar-se a essa acção, se tudo fosse possível efectivar-se num momento - no momento em que não teve tempo ainda de conhecer o que aí se esconde, no momento em que não teve tempo de saber que não era corajoso. Daí que num comício de heroísmo o heroísmo seja fácil e os heróis voluntários se possam recrutar aos montões: a dureza com que se conquista esse heroísmo não se vê sob os braços erguidos que o festejam...»

Vergílio Ferreira, in 'Invocação ao Meu Corpo'


Os medíocres não gostam de ser criticados, desafiados e escondem-se na manta negra da falsa ingenuidade, do falso heroísmo, da balofa e vazia acção, no imobilismo, na cobardia, no pactuarem com quem lhes atira migalhas como ao cão do fidalgo....
Mas, aí estão a fazer uso do que não lhes pertence mas, do qual se apropriaram, com TUDO o que roubam, sem olhar a meios.... 
Os medíocres lambuzam-se com o ranho do servilismo, enquanto os competentes são atirados borda fora....
Resta-lhes pouco tempo!!!
O suspiro final está para breve!!!