A semana finda ficou indubitavelmente marcada pela descida do “Caso Influencer” do Supremo Tribunal de Justiça para o Departamento Central de Investigação e Acção Penal.
A justificação é a de que com a substituição do ex primeiro-ministro, António Costa, o caso perdesse o foro especial que obrigava a que fosse investigado num tribunal superior e passasse para um tribunal de primeira instância. Não vamos, por falta de tempo, escalpelizar tal decisão que como se sabe não é consensual mesmo ao nível de conselheiros e ex-conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça.
Há quem advogue que o foro especial se mantém porque o mesmo é funcional, e não pessoal, ou seja, que se o processo se inicia no Supremo não pode baixar ao Departamento de Investigação e Acção Penal.
Lembrar que o primeiro-ministro, tal como o Presidente da República e o presidente da Assembleia da República, têm direito a foro especial no Supremo Tribunal de Justiça, pelos cargos que exercem. Estão protegidos perante a lei e só podem ser julgados por crimes no exercício das suas funções no Supremo Tribunal de Justiça.
Abandonada a discussão, aqui e agora, regressemos ao cerne da questão. A demissão do ex primeiro-ministro António Costa, na consequência de um parágrafo de um comunicado da Procuradoria Geral da República em que se afirmava que o chefe do governo era alvo de um inquérito instaurado pelo Ministério Público. Em consequência da demissão do ex primeiro-ministro, a legislatura foi interrompida e Marcelo marcou eleições.
O caso ficou conhecido como “Operação Influencer” e levou na altura à detenção de vários cidadãos desde um chefe de gabinete do ex primeiro-ministro, a um consultor e amigo de António Costa e de administradores da empresa Start Campus e do presidente da Câmara de Sines, que ficou em liberdade após interrogatório judicial. Existem ainda outros arguidos, incluindo o agora ex-ministro das Infraestruturas João Galamba e o ex-presidente da Agência Portuguesa do Ambiente. O caso está relacionado com o projeto de construção de um centro de dados na zona industrial e logística de Sines pela Start Campus, a produção de energia a partir de hidrogénio em Sines, e a exploração de lítio no distrito de vila Real, em Montalegre e Boticas.
Segundo o Ministério Público haveria indícios de António Costa ser o intermediário de todo o processo.
Ora eis que o Tribunal da Relação vem rejeitar os argumentos do Ministério Público como ainda anular as medidas de coação impostas aos cinco arguidos individuais e uma arguida pessoa coletiva já citadas. Mas o mais grave é que o Tribunal da Relação não encontra quaisquer indícios de crimes na Operação Influencer. Os juízes dizem no acórdão que as suspeitas que recaiam sobre António Costa são "meras proclamações assentes em deduções e especulações".
Ou seja, o Ministério Público é arrasado e a sua credibilidade é mais uma vez posta em causa. As acusações e suspeições do Ministério Público não se confirmam e pior são negadas.
Então o que levou à demissão do governo num conluio muito mal explicado entre uma Procuradora Geral da República, um Presidente da República e uma precipitação de um primeiro-ministro?
Os portugueses gostariam de ver esclarecido este imbróglio que culminou em eleições. É que podem querer desqualificar os portugueses com tramoias de toda a espécie, mas o povo não vai em cantigas e muito menos em mentiras e jogos de poder. Vir-se dizer para rematar o laço que o país vai muito em breve ganhar um conselheiro europeu é tudo o que não justifica tanta poeira nos olhos dos portugueses. Sejam sinceros e transparentes.
Ironia do destino ou talvez não estamos em semana de se comemorar os 50 anos do 25 de Abril de 1974.
Como tal, não podíamos nem devíamos esquecer a data. Multiplicam-se as celebrações por todo o país.
O 25 de Abril é do povo e não tem donos. Podem nomear as comissões que quiserem com ou sem honra, com ou sem respeito pelas conquistas alcançadas, que o 25 de Abril é e será sempre uma festa do povo. O 25 de Abril abriu horizontes que paulatinamente foram sendo perdidos. Lembrar só que este povo tinha a mais alta taxa de mortalidade infantil, tinha 30% de analfabetos e uma guerra colonial e atrasos civilizacionais que nos colocavam nos piores lugares do desenvolvimento.
Um povo que continua a considerar a data a mais importante da sua História. De um povo que acreditou na utopia e alcançou o que lhe foi negado durante séculos, a participação na vida cívica, a liberdade, os sucessivos direitos que nos eram negados, incluindo o direito à saúde, à cultura, à educação, a uma habitação condigna, a um país verdadeiro onde houvesse lugar para todos com salários justos, ou seja, o direito a viver condignamente.
Tudo se foi perdendo.
O país regrediu em todos os aspectos até na participação cívica.
Comemore-se o 25 de Abril com a dignidade que merece e não com programas para satisfazer irmandades dignas de uma qualquer comissão de festas com mordomos que só servem interesses instalados.
Não queremos o 25 de Abril como um museu.
Queremos lembrar sempre que houve um povo que fez História nesse dia e nos que se seguiram e que o futuro faz-se com os cravos de Abril.
Sempre gratos aos que fizeram acreditar que quando um povo quer conseguimos vencer.
E como cantou Chico Buarque “Já murcharam tua festa, pá/Mas certamente/Esqueceram uma semente/Em algum canto de jardim/”.
Acreditamos que sim.
Tenham uma excelente semana.