Joseph Stiglitz, prémio Nobel da economia, chamou à presente crise financeira a «queda do Muro de Berlim do capitalismo».
De facto, as medidas excepcionais adoptadas nos Estados Unidos e na União Europeia mostram a catástrofe social das políticas liberais.
Esta crise não é o resultado da ganância individual de algumas ovelhas tresmalhadas. Pelo contrário, ela é produzida pelo próprio sistema capitalista, da acumulação sem limite, da concorrência e da especulação.
Dizem-nos, há anos, que a austeridade é inevitável e que não existe dinheiro para responder às necessidades sociais urgentes. Mentira!
Fecham-se serviços públicos, reclamados pelas populações como necessários.
Só o pretexto e não o texto obrigam à mudança!!!
Mente-se.
Agora, para salvar os accionistas de grandes instituições financeiras, os governos e os bancos centrais fazem injecções massivas de dinheiro dos contribuintes.
Em Portugal, a reforma Sócrates na Segurança Social diminuiu as pensões futuras. Há 40% dos desempregados sem subsídio. Mas os portugueses estão a pagar, através de juros altos, a protecção aos lucros dos bancos, tal como na Europa e nos Estados Unidos os impostos pagam os prejuízos das empresas especulativas.
Os governos e a União Europeia têm destruído os sectores públicos da economia.
Resultado: privatiza-se os serviços públicos que possam dar lucro e o Estado só intervém para pagar os prejuízos da má gestão e das fraudes capitalistas.
A política de privatização é hipócrita e esta crise demonstra-o.
A União Europeia processou o Estado português por se manter como accionista privilegiada na EDP.
Mas agora, a mesma União Europeia avança na nacionalização de bancos em derrapagem financeira.
O dogma da liberdade de circulação de capitais produziu offshores, permitiu a lavagem do dinheiro do crime.
Esse dogma está condenado.
As entidades reguladoras já demonstraram a sua incompetência, casos BCP e BPN, e a sua cumplicidade nos preços dos combustíveis.
E também a sua função: ser desculpa da irresponsabilidade do Estado.
O sistema de regulação deve ser estatal porque, só assim é democraticamente controlável.
A exploração cresceu brutalmente. Ao mesmo tempo, atingimos 2 milhões de pobres, sobretudo idosos, e meio milhão de desempregados.
Mas, a ganância patronal não abrandou.
Alguns exemplos:
- no BCP 8 milhões de euros para os administradores suspeitos de terem falsificado contas;
- no BNP, 700 milhões de euros voaram para parte incerta;
- nas Águas de Portugal 2,3 milhões de euros, em prémios aos administradores, quando o grupo teve prejuízos de 75 milhões. Só em viaturas os administradores gastaram 2,5 milhões de euros.
- na TAP, o administrador Fernando Pinto quadruplicou o seu salário em cinco anos;
Os portugueses exigem do governo de Sócrates respostas urgentes.
O escândalo BCP fica-se a dever à paixão dos banqueiros pelos paraísos fiscais, bem como a cumplicidade das entidades de regulação do sector bancário, sempre prontas a fechar os olhos a negócios de milhões.
A comissão de inquérito parlamentar, ao caso BCP, dominada pelo PS e PSD recusou ouvir personalidades determinantes no escândalo do banco privado, e protegeu o abuso do segredo de justiça.
No entanto, os dados recolhidos mostram que a supervisão fracassou.
Enquanto ainda ecoavam as extravagâncias no BCP, eis que surge um novo caso, o BPN.
Há uma década no poder com Cavaco Silva, um belo dia os barões laranja decidiram criar um banco de negócios. Num país como o nosso, a coisa parecia fazer todo sentido. Se havia dinheiro para ganhar com o Estado, e havia, então que ficasse entre mãos amigas. Com o PSD solidamente instalado no poder, o lucro estava garantido. Só que o PSD deixou de cheirar o poder e o BPN ficou sem sentido que não o de garantir o emprego aos rapazes da Lapa.
O caos financeiro há muito que era conhecido e, as suspeitas de irregularidades acumulavam-se.
Miguel Cadilhe decidiu “participar um conjunto de factos à Procuradoria-Geral da Republica por forma a que os mesmo sejam devidamente investigados”.
Curiosamente, parecem apenas envolver quadros médios da empresa. No dia em que os contribuintes vão pagar o experimentalismo financeiro laranja é caso para exigir que a culpa, como de costume, não morra solteira e exigir responsabilidades a quem enviou um banco para o abismo.
O BPN tem uma base política clara, tendo ido buscar pessoas ligadas ao PSD. Para além de Oliveira e Costa, e do líder do Conselho Superior, Rui Machete, também Dias Loureiro, Amílcar Theias, Daniel Sanches e Arlindo de Carvalho, todos ex-ministros sociais-democratas, estiveram sentados em órgãos sociais do grupo. Oliveira e Costa é ainda uma figura controversa, tendo estado associado a uma polémica de perdão de juros fiscais a empresários de Aveiro.
Mais uma vez, onde estavam as entidades reguladoras?
A ASAE decerto mais preocupada com galheteiros, enchidos e bolas de Berlim, nada preocupada no muito «papel» que confina crime económico.
O Governador do Banco de Portugal a preparar mais um Power Point para levar ao Parlamento.
O governo de Sócrates continua a senda de privatizar tudo quanto dá lucro, diminuindo a segurança na economia e a capacidade de controlo sobre as decisões de gestão.
Assim, Sócrates já decretou a privatização sem concurso de mais 7% da GALP, reduzindo a quota do Estado a 1%.
Isso implica um benefício imediato para quem receber essa quota da distribuição petrolífera e permitindo as práticas especulativas da empresa.
A GALP privatizada recebeu, só este ano, mais de 200 milhões de euros em benefícios fiscais. Lucrou até agora cerca de 300 milhões só com o efeito “Robin dos Bosques”.
Nós por cá, mal muito mal!!!
As catedrais do consumismo aí estão para gáudio de uns (poucos) e incerteza de muitos.
Tudo bem ligado com as especulações e falta de supervisão.
Compreenda-se e fiscalize-se antes que o jogo da roleta acabe.
«Crónica publicada no jornal O Interior em 6 de Novembro de 2008»