sexta-feira, fevereiro 17, 2017

Ponto de Vista


Foi recentemente publicado um estudo sobre o índice de transparência envolvendo 308 autarquias nacionais. Este índice mede o grau de transparência na administração local através de uma análise da informação disponibilizada aos cidadãos nas respetivas páginas da internet. São importantes, entre muitas outras, as informações sobre a organização das autarquias, a sua composição e funcionamento, os planos e relatórios, os impostos, as taxas, as tarifas, os preços e os regulamentos, a contratação pública, a transparência económico-financeira, etc., etc.

O poder local constitui uma pedra angular da democracia portuguesa, sendo hoje unânime o reconhecimento pelo serviço prestado à consolidação democrática e ao desenvolvimento do país.

Porém, nos últimos anos, têm ocorrido inúmeras transformações e desafios que condicionam a qualidade e a integridade da governação municipal. São elas a europeização do poder local, o fenómeno da globalização e os seu impactos sociais, económicos e institucionais, o crescente distanciamento dos eleitores em relação aos partidos, a maior exigência de rigor e de ética por parte dos cidadãos em relação aos seus eleitos locais, o aumento das competências das autarquias, o impacto das novas tecnologias no relacionamento dos cidadãos com a governação local, tudo isto sem prejuízo de outras mudanças que o tempo não me permite aqui enumerar. É por isso que tem mudado a forma como as autarquias funcionam e como os cidadãos percecionam essas evoluções.

Neste estudo de que vos falo a câmara da Guarda aparece na posição n.º 252. Isto é, 252 entre 308 autarquias. Uma vergonha! Se falássemos de futebol, a câmara da Guarda estaria a lutar para não descer de divisão. E se falássemos de Educação, reprovava no exame e nem sequer passava de ano!

Só se espanta com esta péssima classificação quem não for ao portal da autarquia na internet e lá constatar a falta de rigor, de transparência e de acuidade da informação que é apresentada. Quanto a propaganda, essa, não falta. O que falta mesmo é informação que seja útil para os munícipes.

Eis um exemplo do distanciamento da autarquia em relação àquilo que nos importa a todos: a última ata da Assembleia Municipal é de 29 de abril de 2016. Se formos às gravações das Assembleias Municipais, a última é ainda mais atrasada, de 18 de dezembro de 2015. 2015, perceberam bem? Sobre planos e relatórios, nada! Se formos ao ítem “relação com a sociedade”, pilar fundamental da gestão democrática, mais uma vez, nada. No que diz respeito a impostos, taxas, tarifas, preços e regulamentos, então é que o Big Bang ainda está para acontecer! Aquilo é um deserto completo!

Em contrapartida não é necessária muita informação para que todos tenhamos já percebido que a especialidade do executivo de Álvaro Amaro são os ajustes diretos. Com transparência q.b., naturalmente, para ninguém atrapalhar os negócios.

É capaz de ser na sequela desse… digamos… recuperado espírito de transparência, que se anunciam agora, com pompa e circunstância, debates sobre um tal de “orçamento participativo”. Só quem não conheça o modus operandi deste executivo é que não desconfia da propaganda eleitoral e do populismo que tudo isto representa. Como se um orçamento participativo alguma vez se pudesse realizar com cidadãos de quem Álvaro Amaro espera sobretudo que vão às urnas votar nele.

Uma sociedade democrática não se reduz ao dia das eleições ou aos atos formais da governação. Realiza-se pelo acolhimento das ideias do outro, pela transparência das mais pequenas ações, pela ética nas tomadas de decisão, pela conquista dos cidadãos para as causas, enfim, por tudo aquilo a que Álvaro Amaro não nos habituou. Naquela que é nossa, um orçamento participativo está para a transparência como uma gota de água para um oceano. Para Álvaro Amaro, transparência é a do plástico e democracia a forma de governo em que o povo julga estar no poder.
Muito bom dia a todos.

(Crónica na Rádio F - 13 de Fevereiro de 2017)