Serão
poucos os portugueses que ainda não perceberam que a banca não passa atualmente
de um caso extremo de economia de compadrio. Em oposição a um capitalismo de
Estado, calhou-nos na rifa um capitalismo que se tornou dono do Estado.
A
banca está a anos-luz de ser o modelo que nos tem sido impingido por políticos
como Cavaco Silva e outros que tais. É hoje um sector oportunista
que tem acumulado lucros à custa do país e beneficiado de uma corrupta proteção
por parte da classe política instalada. Quando tem de pagar impostos, apela aos
políticos para que criem um mecanismo que lhe reduza a carga fiscal. Quando
quer ganhar mais juros, abusa dos seus clientes e pede ao regulador que feche
os olhos. Quando mete o pé na argola em matéria fiscal, faz um requerimento no
“serviço de finanças do Terreiro do Paço” e logo aparecem um parecer ou um
despacho milagrosos que concedem tudo aquilo de que precisam.
Na
Idade Média eram os banqueiros ricos que subsidiavam os Estados. Hoje, são os
Estados que subsidiam os banqueiros. E nós subsidiamos os Estados…
Através
deste sistema de compadrio entre o poder e falsos banqueiros, os políticos arrumam-se
a si próprios, bem como aos seus filhos, namoradas e amigos nos lugares
decorativos da administração dos bancos e colocam os jotas nos balcões.
Outrora,
os bancos recebiam depósitos e emprestavam-nos, retirando da diferença dos
juros o seu lucro. O risco era suportado pelos banqueiros e não pelos
depositantes ou governos. Hoje, pelo contrário, trata-se cada vez mais de
emprestar quantias astronómicas a cúmplices que as usam para atividades que
servem apenas para fazer desaparecer o dinheiro. Por isso as crises financeiras
aprofundaram-se e alastraram a camadas cada vez mais amplas da população à
medida que a pirâmide da dívida disparou e que a qualidade do crédito se
afundou até à categoria tóxica do "empréstimo trapaceiro".
Esta
foi a forma que os herdeiros dos velhos negreiros e das roças encontraram para
se adaptarem aos novos tempos, transpondo para o país natal antigos negócios de
enriquecimento fácil, assentes no sofrimento humano. Por essa razão, quando
ouvirem um político a defender a estabilidade da banca ou a garantir a sua
solidez, ou ele é dono disto tudo ou então alguém é garantidamente dono dele...
E
por isso eu pergunto aos economistas, aos políticos, aos moralistas, se já
calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho
desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à
desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico? Sabem quem fez
esta pergunta? Não fui eu, foi Almeida Garret. Nem mais. Há mesmo coisas que
nunca mudam.
(Crónica
no jornal “O Interior” – 14 de Janeiro de 2016)