O edifício do antigo
Hotel Turismo da Guarda volta a ser notícia. Depois de falhado o projeto
megalómano de transformar o Hotel Turismo em escola de hotelaria, eis que se
anuncia a venda em haste pública do imóvel por 1,7 milhões de euros, pouco mais
de metade dos 3,5 milhões que custou ao Estado. Ou
seja, os contribuintes portugueses vão ter de pagar ainda cerca de 1,8 milhões
de euros. Eu explico.
Depois de se afirmar
como uma unidade hoteleira de referência na região e um ex-libris da cidade e do
concelho, ao longo dos anos assistiu-se à degradação do Hotel Turismo por
vicissitudes várias. Desde logo pela concessão a várias empresas que apenas
tinham como objetivo tirar proveito da história e pergaminhos da unidade. Mas
também porque para alguns quanto pior melhor, para dar espaço ao surgimento de unidades
concorrentes.
Foi em 2010 que a
Câmara Municipal da Guarda assumiu a gestão e exploração do Hotel Turismo,
para, ainda nesse mesmo ano, a pretexto do estado de degradação em que se
encontrava, o encerrar e vender ao Instituto de Turismo de Portugal pela quantia
de 3,5 milhões de euros, com a alegada finalidade de ali ser instalada uma
escola de hotelaria e turismo. Dizia-se então que a escola seria especializada
em saúde e bem-estar dando resposta às necessidades formativas do sector
turístico da região, contribuindo para a criação de emprego qualificado e para
a melhoria dos serviços, em linha com os objetivos do Plano Estratégico
Nacional do Turismo. Com a abertura anunciada para 2016, a nova unidade
representaria um investimento de cerca de 12 milhões de euros. A escola projetada
para 200 a 250 alunos estenderia a sua ação igualmente ao domínio do Turismo
Cultural e Paisagístico, contando com um hotel e um restaurante de aplicação,
um auditório e um refeitório para alunos. Nada disto aconteceu! A unidade
fechou portas em novembro de 2010, para nunca mais abrir. Pelo meio, Joaquim
Valente, com a ajuda do seu amigo José Sócrates e muita propaganda à mistura,
abateu 3,5 milhões e meio de euros à dívida da autarquia…
O atual presidente da
câmara da Guarda, Álvaro Amaro, anuncia agora a venda do imóvel, em hasta
pública, pela Direção-Geral do Tesouro e Finanças. Definiu-o como "uma
pérola da hotelaria nacional". A venda foi por ele considerada como um
passo "muito importante" para o futuro daquele edifício e como um
meio para “devolver o Hotel de Turismo à Guarda, à região e ao país".
Referiu ainda que o processo chegou a um ponto em que "é o mercado
que vai ditar as suas regras". "E espero, [que o mercado] perceba que
estamos perante um hotel que é conhecido do país inteiro e é uma pérola da
Guarda. E também espero que as pérolas tenham o seu valor e que o mercado
perceba isso e que amanhã possamos ter de volta o Hotel [de Turismo] à Guarda,
à região e ao país", declarou Álvaro Amaro.
Convém não esquecer
que, aquando do processo de venda do Hotel às prestações, por Joaquim Valente, pelos
tais 3,5 milhões de euros, Álvaro Amaro não se coibiu de pedir ao
primeiro-ministro, Passos Coelho, para que não pagasse a última prestação devida
à câmara da Guarda. Ou seja, consoante o interesse do momento, assim se fala
umas vezes no não pagamento da venda, e noutras já se refere à pérola da
hotelaria…
O que Álvaro Amaro não
explicou é que, por muitos erros que o seu antecessor tenha cometido, a venda
de 2010 ao Instituto do Turismo de Portugal representou uma efetiva transferência
de dívida local para a Administração Central. Pode criticar-se esse tipo de
engenharia financeira à escala nacional, mas é hoje, graças a ela, que a gestão
de Álvaro Amaro beneficia de um programa PAEL em condições bem menos duras e
penalizadoras para os habitantes da Guarda. E isso Álvaro Amaro já não disse. Também
não explicou quem é que vai encaixar os prejuízos da diferença entre os 3,5
milhões e meio da venda de 2010 e os 1,7 milhões da venda de 2015. O
contribuinte, claro!
Em política há coisas
muito feias. Beneficiar do que outros fizeram, e que nós tentámos um dia
impedir, é uma delas.
Tenham um muito bom dia!
(Crónica na rádio F - 20 de Abril de 2015)