Esta semana a grande
discussão política em Portugal centrou-se no tema da baixa da Taxa Social Única,
mais conhecida por TSU, e na sua relação com o salário mínimo. No meio do ruído
que se criou, escapou a muitos portugueses a compreensão daquilo que realmente
interessa, que é a questão do que é que é melhor para a economia.
Sempre que houve mexidas
na TSU ou meras intenções para a alterar, houve polémica. E até uma gigantesca
manifestação, quando o PSD de Pedro Passos Coelho quis baixar a TSU aos patrões
e transferir esse encargo para os trabalhadores. Mas nem António Costa
descobriu a pólvora nem Pedro Passos Coelho inventou a roda: na verdade, há
muito que o aumento do salário mínimo vem sendo acompanhado de uma redução da TSU
paga pelos empregadores à Segurança Social. É assim pelo menos desde 2010, com
José Sócrates. Em 2014, quando estava no Governo, Passos Coelho também
reduziu em 0,75 pontos percentuais as contribuições das empresas como moeda de
troca para o aumento do salário mínimo para os 505 euros. Nessa altura, Passos
Coelho apresentou essa medida como “estímulo ao emprego”, estímulo que pelos
vistos desapareceu por ser proposto por outro partido.
A mim, como cidadão, o
que me interessa perceber é se a redução da contribuição paga pelas empresas
estimula mesmo a economia e impulsiona realmente o emprego. E se é esse o caso,
porque é que não se mantém a TSU e se reduz em vez dela o IRC ou qualquer outro
tipo de encargo para as empresas? É que qualquer eventual buraco na Segurança
Social resultante de uma redução da TSU terá sempre que ser pago em última
instância pelo orçamento do estado. De facto, há vários problemas que se
levantam com a particular forma de apoio que representa esta redução fiscal.
Em primeiro lugar, o
problema de se “tornar estrutural uma medida que se pensou sempre como
temporária”. Apesar de o “bónus” não implicar os novos contratos que as
empresas venham a celebrar este ano, cria-se uma “expectativa” nos patrões de
que, para o ano, os trabalhadores que hoje forem contratados pelo salário
mínimo lhes venham a sair mais baratos. Ou seja, incentiva de certa forma
a contratação pelo salário mínimo. Basta lembrar que, em 2016, 37% dos novos
contratos foram celebrados com o salário mínimo. São esses que este ano vão ter
“desconto” aos olhos do empregador. É um incentivo que se pode tornar
perverso porque reforça uma tendência negativa. Até António Bagão Félix,
ex-ministro da Segurança Social próximo do CDS, concorda que a medida, ao
ter muito pouco de temporária e quase tudo de recorrente, pode ter esse efeito
“perverso”.
Em segundo lugar, a
redução da TSU equivale sempre a um financiamento dos contribuintes às empresas
para poderem aumentar o salário mínimo. Uma economia destas é uma “economia
fragilizada, subsídio-dependente e baseada em baixos salários”, afirma Bagão
Félix.
Em terceiro lugar,
sempre para Bagão Félix, o problema da redução da TSU para as entidades
empregadoras “discrimina negativamente” as empresas que vivam mais de mão-de-obra
do que de tecnologia e de máquinas e “favorece” aquelas em que a
percentagem de trabalhadores com a remuneração mínima é mais elevada, como é o
caso da restauração e do turismo. Dá até como exemplo da ideia de um estímulo
pouco agradecido por parte dos patrões a redução do IVA de 23% para 13%
ocorrida recentemente, sem repercussão no preço final pago pelos consumidores.
Em suma, para o cidadão
comum a discussão acalorada e pouco objetiva a que se assistiu assemelhou-se
àquela que aconteceria se um corpo de bombeiros, no meio de um fogo, escaramuçasse
sobre se era melhor para o ecossistema retirar-se a água para abastecer as suas
viaturas contra incêndios do topo norte ou do topo sul de um determinado lago.
A forma como toda esta
questão foi conduzida pode resumir-se numa afirmação: os partidos políticos
portugueses são atualmente essencialmente constituídos por dois grupos de
pessoas: um formado por gente totalmente incapaz, o outro por gente capaz de
tudo…
Tenham uma boa semana.
(Crónica na Rádio F - 23 de Janeiro 2017)