Muito
se tem falado de descentralização neste período de pré-campanha eleitoral para
as autárquicas 2017.
O governo diz que está em marcha um programa de
descentralização que vai implicar a transferência de serviços e funcionários
para os municípios. Os municípios esfregam as mãos pois vai entrar dinheiro,
muito dinheiro e principalmente vai haver mais e mais súbditos a comer à mão
dos regedores. Mas comecemos pela definição de descentralização. O que é
descentralizar? Segundo o que nos querem fazer crer a definição até parece
sonhadora. Descentralizar é aproximar aos cidadãos os serviços que o Estado
presta. Segundo os mentores e ideólogos da teoria da descentralização não
haverá desresponsabilização, antes pelo contrário, os cidadãos poderão
fiscalizar mais e melhor o funcionamento dos serviços que se prevêem venham a
ser descentralizados. Pergunta-se como? Se a transferência vai ser realizada
para os municípios e dada a opacidade dos mesmos como pode alguém argumentar
com maior fiscalização? Os municípios vão passar a ter competências para
contratar e despedir funcionários não docentes, competências na construção e
manutenção de edifícios escolares, na logística da Acção Social Escolar, das
refeições escolares em todos os níveis de ensino, construir e gerir centros de
saúde e mais competências na área da acção social com a sopa dos pobres e a
caridadezinha debaixo da sua alçada. Já na área do património passam a poder
avaliar e reavaliar os imóveis para cálculo do IMI. A descentralização
englobará também a protecção civil, cultura, policiamento de proximidade,
estacionamento público, captação de investimento, áreas protegidas, áreas
portuárias, praias e muito provavelmente também na área da segurança alimentar.
Também as freguesias e em especial as comunidades intermunicipais vão ter mais
competências. O sistema como está tem contribuído para que as câmaras maiores
estejam cada vez mais apetrechadas e, de alguma forma, com mais recursos e as
mais pequenas, nomeadamente as das ilhas e do interior do país, estejam cada
vez piores. O Orçamento do Estado está a somar mais àqueles que já têm mais
receitas próprias. O que é certo é que PSD e PS em matéria de descentralização
estão em total acordo. Afincadamente argumentam que os municípios têm condições
para defenderem mais e melhor algumas competências que hoje estão atribuídas ao
poder central. E pergunta-se, o que fazem o Bloco e o PCP? Assobiam para o lado
ou fingem que estão em desacordo, mas lá vão aproveitando a boleia até por que
o PCP tem muita câmara que pode vir a beneficiar com a transferência de
competências? Se ouvirmos quer PSD quer PS só há vantagens na descentralização.
Não encontram nenhuma desvantagem, o que nos leva a supor que algo muito
estranho e maléfico está para acontecer. Desde logo afigura-se-nos uma
regionalização encapotada. Recordar para os menos atentos que aquando do
referendo sobre a regionalização o sim obteve 36% e o não 64% dos votantes,
sendo que a abstenção atingiu 52%. Para o PS se esta descentralização avançar
então o país estará mais maduro do que em 1998 para aceitar a regionalização.
Tudo claro. A habitual cenoura ao burro. Há mesmo quem defenda que a
descentralização e a regionalização são processos complementares. Ora então
tudo fica bem mais claro, se dúvidas existissem! Do que se sabe, e é muito
pouco, dado que as negociações com a Associação Nacional de Municípios são de
um secretismo assustador só haverá descentralização a sério para depois das
eleições autárquicas. Fica uma pergunta à qual o governo ainda não deu resposta.
Por que razão a descentralização não determinou uma tomada de posição
relativamente às Comissões de Coordenação das regiões? Será pelo facto dos
respectivos presidentes terem sido aumentados em 29%? Percebe-se bem a intenção
de tal tomada de posição. Já quanto a segredos e a negócios celebrados nas
costas dos portugueses revela bem a intenção de quem os negoceia e a falta de
transparência que sempre os caracterizou.
Tenham um bom dia.
(Crónica
Rádio F - 5 de Junho de 2017)