quarta-feira, junho 07, 2017

Ponto de Vista

Muito se tem falado de descentralização neste período de pré-campanha eleitoral para as autárquicas 2017. 
O governo diz que está em marcha um programa de descentralização que vai implicar a transferência de serviços e funcionários para os municípios. Os municípios esfregam as mãos pois vai entrar dinheiro, muito dinheiro e principalmente vai haver mais e mais súbditos a comer à mão dos regedores. Mas comecemos pela definição de descentralização. O que é descentralizar? Segundo o que nos querem fazer crer a definição até parece sonhadora. Descentralizar é aproximar aos cidadãos os serviços que o Estado presta. Segundo os mentores e ideólogos da teoria da descentralização não haverá desresponsabilização, antes pelo contrário, os cidadãos poderão fiscalizar mais e melhor o funcionamento dos serviços que se prevêem venham a ser descentralizados. Pergunta-se como? Se a transferência vai ser realizada para os municípios e dada a opacidade dos mesmos como pode alguém argumentar com maior fiscalização? Os municípios vão passar a ter competências para contratar e despedir funcionários não docentes, competências na construção e manutenção de edifícios escolares, na logística da Acção Social Escolar, das refeições escolares em todos os níveis de ensino, construir e gerir centros de saúde e mais competências na área da acção social com a sopa dos pobres e a caridadezinha debaixo da sua alçada. Já na área do património passam a poder avaliar e reavaliar os imóveis para cálculo do IMI. A descentralização englobará também a protecção civil, cultura, policiamento de proximidade, estacionamento público, captação de investimento, áreas protegidas, áreas portuárias, praias e muito provavelmente também na área da segurança alimentar. Também as freguesias e em especial as comunidades intermunicipais vão ter mais competências. O sistema como está tem contribuído para que as câmaras maiores estejam cada vez mais apetrechadas e, de alguma forma, com mais recursos e as mais pequenas, nomeadamente as das ilhas e do interior do país, estejam cada vez piores. O Orçamento do Estado está a somar mais àqueles que já têm mais receitas próprias. O que é certo é que PSD e PS em matéria de descentralização estão em total acordo. Afincadamente argumentam que os municípios têm condições para defenderem mais e melhor algumas competências que hoje estão atribuídas ao poder central. E pergunta-se, o que fazem o Bloco e o PCP? Assobiam para o lado ou fingem que estão em desacordo, mas lá vão aproveitando a boleia até por que o PCP tem muita câmara que pode vir a beneficiar com a transferência de competências? Se ouvirmos quer PSD quer PS só há vantagens na descentralização. Não encontram nenhuma desvantagem, o que nos leva a supor que algo muito estranho e maléfico está para acontecer. Desde logo afigura-se-nos uma regionalização encapotada. Recordar para os menos atentos que aquando do referendo sobre a regionalização o sim obteve 36% e o não 64% dos votantes, sendo que a abstenção atingiu 52%. Para o PS se esta descentralização avançar então o país estará mais maduro do que em 1998 para aceitar a regionalização. Tudo claro. A habitual cenoura ao burro. Há mesmo quem defenda que a descentralização e a regionalização são processos complementares. Ora então tudo fica bem mais claro, se dúvidas existissem! Do que se sabe, e é muito pouco, dado que as negociações com a Associação Nacional de Municípios são de um secretismo assustador só haverá descentralização a sério para depois das eleições autárquicas. Fica uma pergunta à qual o governo ainda não deu resposta. Por que razão a descentralização não determinou uma tomada de posição relativamente às Comissões de Coordenação das regiões? Será pelo facto dos respectivos presidentes terem sido aumentados em 29%? Percebe-se bem a intenção de tal tomada de posição. Já quanto a segredos e a negócios celebrados nas costas dos portugueses revela bem a intenção de quem os negoceia e a falta de transparência que sempre os caracterizou. 
Tenham um bom dia.


(Crónica Rádio F - 5 de Junho de 2017)