As bestas que nos governam e as hipo-bestas que escreveram naqueles erros chamados os nossos jornais não têm uma obscura intuição da diferença. (…)
Os nossos políticos não são gente. Nenhum deles mostra ter tido na sua vida uma daquelas crises espirituais donde se emerge talvez ferido para sempre, mas psiquicamente homem, personalidade espiritual.
São ateus pela mesma razão que o é um burro ou uma árvore.
São portugueses porque, por desgraça nossa, nasceram adentro da nossa fronteira, oriundos de gente que secularmente assim tinha feito. Nenhum detalhe psíquico os mostra portugueses. Nenhuma centelha lhes acende um momento o olhar. São vazios e estúpidos. Só sabem comer e manobrar para comer. (…)
O sr. não se bateu pela Pátria. Não se podia bater pela Pátria, porque não tem Pátria por que se bater. Não me refiro agora, já à circunstância de o sr., não tendo um conceito português da vida, não pode ser, por isso, considerado português. Refiro a outra, e mais grave, circunstância com a qual o sr. nada tem. Refiro-me ao facto de que nenhum de nós tem Pátria.
O Português é hoje um expatriado no seu próprio país.
Somos uma nação, não uma pátria; somos um agregado humano sem aquela alma colectiva que constitui uma Pátria.
Somos… Sei lá o que nós somos? Sabe alguém o que nós somos, salvo o lugar por onde um cataclismo vai passar…
Somos… Sei lá o que nós somos? Sabe alguém o que nós somos, salvo o lugar por onde um cataclismo vai passar…
Fernando Pessoa