No
sábado passado comemorou-se o dia do trabalhador. No
dia 1º de Maio de 1886, 500 mil trabalhadores saíram às ruas de
Chicago, nos Estados Unidos, em manifestação pacífica, exigindo a
redução da jornada para oito horas de trabalho. A polícia reprimiu
a manifestação, dispersando a concentração, depois de ferir e
matar dezenas de operários. A luta não parou e a solidariedade
internacional pressionou o governo americano a anular o falso
julgamento e a elaborar novo júri, em 1888. Os membros que
constituíam o júri reconheceram a inocência dos trabalhadores,
culparam o Estado americano e ordenaram que soltassem os 3 presos.
Em 1889 o Congresso Operário Internacional, reunido em Paris, decretou o 1º de Maio, como o Dia Internacional dos Trabalhadores, um dia de luto e de luta. E, em 1890, os trabalhadores americanos conquistaram a jornada de trabalho de oito horas. Finalmente! O Dia Internacional dos Trabalhadores devia ser comemorado por todos, independentemente da sua filiação sindical. O dia é de todos os trabalhadores e não é exclusivo de quem quer que seja. Atente-se que eu falo de trabalhadores. Não falo da eufemistica e hipócrita nova forma de chamar àqueles que vendem a sua força de trabalho de colaboradores. Não há colaboradoras nas relações laborais como o neoliberalismo quer incutir na linguagem desigual entre quem detém o capital e quem vende a sua força de trabalho seja manual, intelectual ou de outra qualquer índole. De um lado o patrão e do outro o trabalhador. Sempre em condições desiguais de relacionamento pois que a lei da oferta e da procura determina as condições de trabalho e as míseras migalhas que caem do banquete para a boca do trabalhador. Se querem mudar a linguagem e adoptarem mais uma hipócrita e manhosa convivência social entendam que colaborador deve estar associado a uma política de motivação da empresa. Que deve começar pela adopção de uma administração participativa onde os trabalhadores têm espaço e oportunidade para opinar e onde existam canais para essas ideias sejam colocadas em prática. Deve existir um plano de carreira que permita que os trabalhadores vejam o seu futuro associado ao sucesso da empresa e, consequentemente, à distribuição dos lucros. Ora quem identifica tais características na quase totalidade das empresas aonde o termo vem sendo aplicado? Nenhumas. A expressão pode levar o trabalhador a esquecer-se da sua condição de submissão, que não deixa de existir mesmo quando uma empresa é mais participativa. Nalguns casos o termo pode até ser manipulado pelas empresas para negar os direitos dos trabalhadores. Esqueçamos a discussão que só interessa para iludir a realidade e lembremos o passado nada fácil do trabalhador em Portugal concretamente na nossa região. Desde os trabalhadores dos lanifícios que labutavam em condições desumanas com pavilhões enormes com luz reduzida, sempre com muita humidade e onde os acidentes aconteciam ao menor descuido, passando pelos trabalhadores da indústria dos cobertores e mantas, da cestaria, dos trabalhadores rurais e da pastorícia dos laticínios, dos trabalhadores do sector automóvel, das minas a céu aberto onde tantos e tantas encontraram a morte ou sofreram sequelas incuráveis, incluindo os funcionários públicos e do mundo dos serviços quem se pode esquecer das amarguras, tristezas e do pão amargo que se conseguia com a féria. Aqui e hoje lembrá-los é prestar-lhes a enorme admiração pelo seu labor em prol de terceiros, e de uma vida cheia de espinhos. Esta é a nossa mais que justificada e singela homenagem. Faziam turnos e turnos. Comiam a triste côdea a um canto do pavilhão. Mulheres, sim as mulheres também para além do amanho das terras e do cuidar dos filhos ainda vendiam a sua força de trabalho na fábrica. Quantas vezes vendendo ou dando tudo para ajudar à féria. Quantas mulheres compradas por umas cascas de feijão e uma garrafa de aguardente. Quantas? Já naquele tempo se usava o álcool para aliviar o sofrimento. Quem se pode esquecer das tristes almas que a pé ou se a féria o permitia de bicicleta sempre com as molas a segurarem as bainhas das calças para não as sujarem nas corrente e pedaleiras, iam pelos caminhos quer chovesse, nevasse ou fizesse sol. Esquecer? Nunca. Sofridos, amargurados e presos ao destino cruel de terem nascido num país onde a lei era a do chefe. Descanso só ao domingo. Quem se pode admirar que a exaustão tomasse conta do povo amordaçado e escravo? O êxodo da emigração rebenta nos anos 60. Uma das causas encontramo-la na miséria que era imposta ao povo. E hoje? Faz sentido comemorar o Dia do Trabalhador? Com toda a certeza que faz. Os direitos dos trabalhadores cada vez mais reduzidos quando não escamoteados. O Dia do Trabalhador é feriado, sabiam? Fazem por esquecer. Com o beneplácito dos governantes o trabalhador é obrigado, por algumas empresas, a esquecerem o seu dia. Hipócritas. A exploração do trabalhador atinge limites inimagináveis em pleno século XXI. A célebre mobilidade é coisa obrigatória e quem a não quiser é lhe apontada a porta de saída. Salários de miséria, pausas proibidas e horas de trabalho sem limites. Com a pandemia o capitalismo encontrou uma nova forma de relação laboral – o teletrabalho. Poupa na energia dos gabinetes, nas comunicações e tem o trabalhador sempre disponível. Acabou-se a relação social do trabalho tão pouco a gosto do patronato. Sindicatos fortes diz uma ministra? Como se com o teletrabalho plenários e reuniões no tal espaço de opinião que os neoliberais tanto defendem acabaram. O teletrabalho abriu espaço à espionagem e vigilância apertada sobre os trabalhadores. Hoje os antigos chefes das secções foram substituídos por máquinas que tudo controlam. O Dia do Trabalhador tem de ser um dia de protesto e luta. Luta pelos direitos de todos. Ou como escreveu John Steinbeck, em As Vinhas da Ira, « Onde houver uma luta para que os famintos possam comer, eu estarei lá. Onde houver um polícia a bater num cidadão, eu estarei lá. Estarei onde os homens gritam quando estão enlouquecidos. Estarei onde as crianças riem quando estão com fome e sabem que o jantar está pronto. E, quando as pessoas estiverem a comer o que plantaram e a viverem nas casas que construíram, eu também estarei lá.”
Tenham uma boa semana.
Em 1889 o Congresso Operário Internacional, reunido em Paris, decretou o 1º de Maio, como o Dia Internacional dos Trabalhadores, um dia de luto e de luta. E, em 1890, os trabalhadores americanos conquistaram a jornada de trabalho de oito horas. Finalmente! O Dia Internacional dos Trabalhadores devia ser comemorado por todos, independentemente da sua filiação sindical. O dia é de todos os trabalhadores e não é exclusivo de quem quer que seja. Atente-se que eu falo de trabalhadores. Não falo da eufemistica e hipócrita nova forma de chamar àqueles que vendem a sua força de trabalho de colaboradores. Não há colaboradoras nas relações laborais como o neoliberalismo quer incutir na linguagem desigual entre quem detém o capital e quem vende a sua força de trabalho seja manual, intelectual ou de outra qualquer índole. De um lado o patrão e do outro o trabalhador. Sempre em condições desiguais de relacionamento pois que a lei da oferta e da procura determina as condições de trabalho e as míseras migalhas que caem do banquete para a boca do trabalhador. Se querem mudar a linguagem e adoptarem mais uma hipócrita e manhosa convivência social entendam que colaborador deve estar associado a uma política de motivação da empresa. Que deve começar pela adopção de uma administração participativa onde os trabalhadores têm espaço e oportunidade para opinar e onde existam canais para essas ideias sejam colocadas em prática. Deve existir um plano de carreira que permita que os trabalhadores vejam o seu futuro associado ao sucesso da empresa e, consequentemente, à distribuição dos lucros. Ora quem identifica tais características na quase totalidade das empresas aonde o termo vem sendo aplicado? Nenhumas. A expressão pode levar o trabalhador a esquecer-se da sua condição de submissão, que não deixa de existir mesmo quando uma empresa é mais participativa. Nalguns casos o termo pode até ser manipulado pelas empresas para negar os direitos dos trabalhadores. Esqueçamos a discussão que só interessa para iludir a realidade e lembremos o passado nada fácil do trabalhador em Portugal concretamente na nossa região. Desde os trabalhadores dos lanifícios que labutavam em condições desumanas com pavilhões enormes com luz reduzida, sempre com muita humidade e onde os acidentes aconteciam ao menor descuido, passando pelos trabalhadores da indústria dos cobertores e mantas, da cestaria, dos trabalhadores rurais e da pastorícia dos laticínios, dos trabalhadores do sector automóvel, das minas a céu aberto onde tantos e tantas encontraram a morte ou sofreram sequelas incuráveis, incluindo os funcionários públicos e do mundo dos serviços quem se pode esquecer das amarguras, tristezas e do pão amargo que se conseguia com a féria. Aqui e hoje lembrá-los é prestar-lhes a enorme admiração pelo seu labor em prol de terceiros, e de uma vida cheia de espinhos. Esta é a nossa mais que justificada e singela homenagem. Faziam turnos e turnos. Comiam a triste côdea a um canto do pavilhão. Mulheres, sim as mulheres também para além do amanho das terras e do cuidar dos filhos ainda vendiam a sua força de trabalho na fábrica. Quantas vezes vendendo ou dando tudo para ajudar à féria. Quantas mulheres compradas por umas cascas de feijão e uma garrafa de aguardente. Quantas? Já naquele tempo se usava o álcool para aliviar o sofrimento. Quem se pode esquecer das tristes almas que a pé ou se a féria o permitia de bicicleta sempre com as molas a segurarem as bainhas das calças para não as sujarem nas corrente e pedaleiras, iam pelos caminhos quer chovesse, nevasse ou fizesse sol. Esquecer? Nunca. Sofridos, amargurados e presos ao destino cruel de terem nascido num país onde a lei era a do chefe. Descanso só ao domingo. Quem se pode admirar que a exaustão tomasse conta do povo amordaçado e escravo? O êxodo da emigração rebenta nos anos 60. Uma das causas encontramo-la na miséria que era imposta ao povo. E hoje? Faz sentido comemorar o Dia do Trabalhador? Com toda a certeza que faz. Os direitos dos trabalhadores cada vez mais reduzidos quando não escamoteados. O Dia do Trabalhador é feriado, sabiam? Fazem por esquecer. Com o beneplácito dos governantes o trabalhador é obrigado, por algumas empresas, a esquecerem o seu dia. Hipócritas. A exploração do trabalhador atinge limites inimagináveis em pleno século XXI. A célebre mobilidade é coisa obrigatória e quem a não quiser é lhe apontada a porta de saída. Salários de miséria, pausas proibidas e horas de trabalho sem limites. Com a pandemia o capitalismo encontrou uma nova forma de relação laboral – o teletrabalho. Poupa na energia dos gabinetes, nas comunicações e tem o trabalhador sempre disponível. Acabou-se a relação social do trabalho tão pouco a gosto do patronato. Sindicatos fortes diz uma ministra? Como se com o teletrabalho plenários e reuniões no tal espaço de opinião que os neoliberais tanto defendem acabaram. O teletrabalho abriu espaço à espionagem e vigilância apertada sobre os trabalhadores. Hoje os antigos chefes das secções foram substituídos por máquinas que tudo controlam. O Dia do Trabalhador tem de ser um dia de protesto e luta. Luta pelos direitos de todos. Ou como escreveu John Steinbeck, em As Vinhas da Ira, « Onde houver uma luta para que os famintos possam comer, eu estarei lá. Onde houver um polícia a bater num cidadão, eu estarei lá. Estarei onde os homens gritam quando estão enlouquecidos. Estarei onde as crianças riem quando estão com fome e sabem que o jantar está pronto. E, quando as pessoas estiverem a comer o que plantaram e a viverem nas casas que construíram, eu também estarei lá.”
Tenham uma boa semana.
(Crónica Rádio F - 3 de Maio 2021)