sexta-feira, março 21, 2014

Gostei de ler

Almofada de pedra

 por VIRIATO SOROMENHO MARQUES


Como é que designaríamos o comportamento de um cidadão que, incapaz de honrar um crédito pessoal a uma taxa de 3,35%, prestes a atingir a maturidade, contraísse um novo empréstimo a uma taxa de 5,11% para pagar o primeiro ("troca de dívida")?
Sem dúvida, tratar-se-ia de um comportamento pouco recomendável. 
E como seria classificado esse comportamento se o cidadão em causa utilizasse parte do novo empréstimo (de 11-02-2014) para antecipar, parcialmente, o pagamento em 19,5 meses do primeiro empréstimo, pagando 102,89 euros por cada 100 euros de dívida ("recompra")? 
Seria, certamente, uma atitude temerária, pois aumenta a despesa com juros para apenas empurrar a dívida para o futuro. 
Pois é isso que o Governo pretende fazer hoje. 
O leitor pode ir ao site eletrónico do IGCP. 
Abra o boletim mensal de fevereiro sobre "Dívida Pública".
Na página 2, vê que o Estado vai ter de resolver até 2016 cerca de 39 mil milhões de euros de empréstimos. 
Esse imenso obstáculo tem sido o pretexto para a constituição de uma volumosa "almofada" financeira. 
Tudo indica que o IGCP quer recomprar, hoje, uma parte de uma série de dívida a dez anos, contraída a partir de outubro de 2005 (ver página 3). 
Se o fizer, às taxas mais recentes no mercado secundário, isso significa que, para o montante que for hoje amortizado, vamos pagar mais 3,53% de juros por ano até Outubro de 2015 do que antes das duas operações financeiras supracitadas. 
Será isto uma gestão prudente, ditada pelo interesse nacional, ou estará o Tesouro público em risco para alimentar uma ilusão pré-eleitoral de triunfo? 
Será esta uma almofada que alivia o País, ou uma pedra amarrada às pernas que o atira para o fundo? Temos direito a saber a lógica com que se joga o dinheiro sonegado aos salários e às pensões. 
Direito a uma explicação, ou a uma beliscadela que nos acorde deste pesadelo.