sexta-feira, fevereiro 21, 2014

Leitura



«A Cultura Portuguesa e o Provincianismo

A cultura portuguesa tem um amor fatal pelo provincianismo. 
O provincianismo é a forma mais «engagée» de existir socialmente e literariamente. 
Daí a impossibilidade, ou melhor, o medo de se realizar sequer um realismo a sério, porquanto este exige uma descida ao inferno e não vejo por aí quem se atreva além do purgatório. 
Fica-se assim na meia tinta do naturalismo, retratando quadros convencionais de uma sociedade provinciana onde, além da já muito conhecida injustiça social (reparável pela economia e não pela literatura), nada se capta que possa sugerir a simples violência de se estar no mundo. 
Provincianismo chama-se ainda àquela nossa atitude que toma muito a sério ou, ainda, solenemente, tudo o que faz, tornando inviável uma literatura que desmonte eficazmente a engrenagem humana e social pela incomplacente investida de um humor cruel. Houve recentes tentativas queirozianas para denunciar as fraquezas do meio. 
Conseguiu-se fazer realismo desta vez? 
Também não, porque se fez realismo de empréstimo, de segunda mão, colhido no «diz-se diz-se» das esquinas. 
Escreveu-se razoavelmente má-língua, mas não se agitaram as pessoas e as instituições de forma a tornar visível o lodo depositado no fundo. Isto quanto aos que fazem profissão de fé de realismo social ou burguês. 
Neste capítulo, não podemos competir com os mestres do neo-realismo americano e europeu, que bons ou maus, para quem aprecia o género, já disseram a última palavra.» 
Natália Correia, in 'Entrevista (1983).

Como me delicio a ler este texto.
Aprende-se!!!
Será que custa assim tanto ser humilde e reconhecer que a aprendizagem também se faz?
PERCEBES, COCHINO???